Revista de Ciências Sociais — Fortaleza, v. 53, n. 1, mar./jun., 2022
DOI: 10.36517/rcs.2022.1.d06
ISSN: 2318-4620
O desmonte dos direitos trabalhistas e a
imposição de limites à ação reivindicatória dos trabalhadores
(2011–2021):
uma análise da “agenda” conservadora da Confederação Nacional das
Instituições Financeiras (CNF)
Danilo Enrico
Martuscelli
Universidade Federal de Uberlândia, Brasil
daniloenrico@gmail.com
Nayara Letícia Sartori da
Silva
Universidade Federal da Fronteira Sul, Brasil
nayara.uffs@gmail.com
Após o golpe de Estado perpetrado contra a presidente Dilma Rousseff em 2016,2 assistimos a um processo de implementação de uma série de contrarreformas neoliberais que promoveram mudanças significativas na legislação social e trabalhista brasileira e impactaram regressivamente as condições de reprodução da força de trabalho no país. As contrarreformas neoliberais mais importantes foram as seguintes: a) a Emenda Constitucional do Teto dos Gastos Públicos (EC nº. 95/2016), que impôs um caráter contracionista à política fiscal, estabelecendo limitações draconianas às despesas primárias por vinte anos, ao mesmo tempo que excluiu de tal restrição os gastos governamentais relacionados ao pagamento e à rolagem da dívida pública (TAVARES; SILVA, 2020);3 b) a Reforma Trabalhista que foi regulamentada pela lei de terceirização (Lei nº. 13.429/2017) e por uma nova legislação trabalhista (Lei nº. 13.437/2017), estabelecendo cortes de direitos trabalhistas e desmonte da proteção social, e enfraquecendo os sindicatos dos trabalhadores nas negociações com as entidades patronais e empresas (TEIXEIRA et al., 2017); e c) a Reforma Previdenciária (EC nº. 103/2019), que desestruturou as bases solidárias e o potencial distributivo do sistema de seguridade social constituído a partir da Constituição Federal de 1988 (FAGNANI, 2019).
Ainda que apresentadas pelos governos e organizações patronais sob a promessa de modernização do país, de ampliação da eficiência e da competitividade das empresas e de aumento do bem-estar da sociedade em geral ou mesmo como soluções inevitáveis para superar a crise econômica e social, todas essas alterações na legislação trabalhista e social podem ser caracterizadas como contrarreformas pelas seguintes razões:
por possuírem um conteúdo regressivo do ponto de vista dos direitos sociais e trabalhistas, ou seja, são regulamentações que visam a conter os gastos do Estado e/ou das empresas com o pagamento de direitos sociais e trabalhistas e a desmontar as políticas de proteção social no país, garantindo, assim, uma espécie de remuneração “ótima” para o conjunto dos capitalistas; e
por contemplarem, de modo geral, os interesses econômicos do conjunto da burguesia — que almeja reduzir os encargos decorrentes dos custos da reprodução da força de trabalho e impor uma tributação regressiva — e, de modo particular, os interesses do capital financeiro nacional e internacional — que reivindicam a constituição de um ambiente econômico favorável ao cumprimento de contratos4 oriundos da obtenção de empréstimos por parte do Estado e das empresas junto aos principais credores os quais, como podemos observar na tabela abaixo, são os grandes bancos comerciais e os fundos de investimentos.
TABELA 1 — Evolução anual da base de detentores da Dívida Pública Mobiliária Federal Interna (DPMFi) — em %
Detentores da dívida/ano | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | 2017 | 2018 | 2019 | 2020 |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Instituições financeiras | 31,5* | 30,1 | 30,2 | 29,8 | 25,0 | 23,1 | 22,3 | 22,7 | 24,7 | 29,6 |
Fundos de investimento | 25,3 | 24,7 | 21,7 | 20,3 | 19,6 | 22,1 | 25,2 | 26,9 | 26,7 | 26,0 |
Fundos de previdência | 15,4 | 16,0 | 17,1 | 17,1 | 21,4 | 25,1 | 25,5 | 25,0 | 24,9 | 22,6 |
Não residentes | 11,3 | 13,7 | 16,1 | 18,6 | 18,8 | 14,3 | 12,1 | 11,2 | 10,4 | 9,2 |
Governo | 8,8 | 7,3 | 6,6 | 5,7 | 5,8 | 5,5 | 4,8 | 4,2 | 4,0 | 3,8 |
Seguradoras | 4,1 | 3,9 | 4,0 | 4,1 | 4,6 | 4,6 | 4,6 | 4,1 | 3,9 | 3,7 |
Outros | 3,6 | 4,3 | 4,3 | 4,4 | 4,9 | 5,4 | 5,6 | 5,9 | 5,4 | 5,1 |
Fonte: Relatório Anual da Dívida Pública — 2012–2021 | ||||||||||
* Em negrito, destaca-se por ano o principal grupo de instituições detentoras da DPMFi. |
Na análise dessas contrarreformas sociais de orientação neoliberal, torna-se fundamental debater a dimensão dos conflitos de classe: afinal, como se posicionaram as diferentes frações de classe e seus órgãos de representação no processo de aprovação desse conjunto de legislações?
Seria inviável no espaço deste artigo examinar todas as contrarreformas supracitadas e a posição de todos os agentes implicados em suas regulamentações. Com vistas a oferecer uma contribuição para esse debate, julgamos oportuno fazer um recorte analítico e eleger uma das contrarreformas e um dos agentes que desempenhou papel decisivo em sua implementação.
Nesse sentido, propomo-nos a examinar a posição adotada pela Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF) diante da contrarreforma trabalhista, tomando como referência a conjuntura de 2011 a 2021. Tal amplitude temporal nos permitirá observar quais reivindicações foram mobilizadas no período prévio à aprovação da reforma trabalhista de 2017, identificar em que medida foram atendidas e analisar quais objetivos a CNF continuou a perseguir após a aprovação da nova legislação trabalhista.
Atualmente, ainda que a Federação Brasileira dos Bancos (FEBRABAN) possua maior presença no debate político nacional,5 é a CNF que exerce o papel de principal órgão de representação das instituições financeiras no país, em especial, dos grandes bancos comerciais nacional e estrangeiros — que não só assumiram uma posição de destaque diante das demais instituições financeiras na presidência da CNF, como podem ser considerados as entidades financeiras que mais empregam força de trabalho quando comparados às demais entidades.
Propomo-nos, neste artigo, a demonstrar a tese de que a CNF apoiou e ajudou a elaborar a legislação que promoveu o desmonte dos direitos trabalhistas com vistas a reduzir os custos das empresas com a reprodução da força de trabalho, além de sustentar como bandeira política o primado do negociado sobre o legislado nas relações de trabalho com o objetivo de limitar o alcance e disciplinar a ação reivindicatória das classes trabalhadoras.
O artigo está estruturado da seguinte maneira: na primeira parte, abordamos a questão da representação da CNF; na segunda, expomos a centralidade que as questões trabalhista e sindical possuem em seus documentos oficiais; por fim, analisamos o conteúdo das propostas da CNF a partir dos quais podemos observar não só a defesa da contrarreforma trabalhista como também de propostas que visam a neutralizar a ação reivindicatória dos trabalhadores.
Desde já é preciso destacar que a própria criação da CNF, ocorrida em 1985, esteve ligada às conflituosas relações das entidades financeiras com o crescente movimento grevista, em especial, dos trabalhadores bancários, e aos processos de alteração da legislação do sistema financeiro previstos pela Assembleia Constituinte, na segunda metade dos anos 1980. Como observa Minella:
Desde o fim dos anos 70, os trabalhadores bancários retomam a cena com importantes movimentos grevistas associados a uma influência cada vez maior das “oposições sindicais” na organização dos bancários [...]. O movimento dos trabalhadores bancários levantaria, também, resistência aos planos de privatização ou liquidação dos bancos estaduais. [...] Novos desafios foram colocados, o Congresso Nacional passou a receber maior atenção, e a eleição para a Assembleia Nacional Constituinte forçou o empresariado a uma ação minimamente coordenada no sentido de resguardar seus interesses na elaboração da Carta Magna. (MINELLA, 1994, p. 511–512).
Tal postura responsiva aos problemas relacionados ao conflito distributivo de classe nos permite entender a centralidade que as questões trabalhistas e sindicais passaram a ter nos documentos oficiais da CNF a partir de 2011, momento em que se observa no país uma retomada do movimento grevista e os primeiros efeitos da crise econômica mundial de 2008 — crise que ganha contornos mais claros a partir de 2015 (SOUZA, TRÓPIA, 2016; MARCELINO; GALVÃO, 2020). Cabe salientar a importância que teve o conflito de classes e a emergência de um cenário de crise econômica para que as demandas pelas contrarreformas sociais passassem a ganhar centralidade nas posições tomadas por importantes representações do capital financeiro no país. Em 2010, por exemplo, na transição do governo Lula para o governo Dilma, Roberto Setúbal, então presidente do Itaú, afirmava não ser hora de grandes reformas:
Para Setúbal, grandes reformas, como a tributária, a trabalhista e a política, “param” o país, e não necessariamente servem para alterar “tanto” as relações no país. “Imagina uma reforma trabalhista? O Brasil iria parar para discussões intermináveis que, ao final, poderiam nem alterar tanto as coisas” [...] “se não fizermos nada, ainda assim cresceremos forte no curto prazo” (VILLAVERDE, 2010, s.p.).
Na mesma conjuntura, Luiz Carlos Trabuco Cappi, então presidente do banco Bradesco, e Fábio Barbosa, que exercia a presidência da FEBRABAN e da CNF e era vinculado ao banco Santander, manifestavam mais preocupação com a defesa da manutenção do tripé macroeconômico — câmbio flutuante, metas de inflação e disciplina fiscal (Cf. VACCARI; PEREZ, 2017) —, ainda que não descartassem a necessidade de realizar reformas no futuro próximo. Mesmo reconhecendo as dificuldades políticas para tratar das “grandes reformas” trabalhista, previdenciária e tributária naquela conjuntura, Barbosa (2010) e Cappi (2010) sustentavam que seria inviável adiá-las por muito tempo.
Esse posicionamento de representantes dos grandes bancos comerciais mudou rapidamente ao longo do primeiro governo Dilma com o “acirramento” do conflito distributivo.6 Em 2015, no contexto de crise econômica do segundo governo Dilma, Roberto Setúbal (2015) demonstrava ter mudado significativamente de posição, passando a tratar a reforma trabalhista como um tema incontornável. Para ele, ter-se-ia configurado no país uma “indústria de ação trabalhista”, e, para evitar isso, seria necessário fortalecer as negociações coletivas entre sindicatos dos trabalhadores e empresas: “Não é mudar a lei, mas permitir que setores diferentes negociem em função das suas características, das suas peculiaridades, permitir negociação setor a setor”.
Observamos, no entanto, que, mesmo antes desse pronunciamento, o acompanhamento de propostas de reformas já era algo que preocupava as entidades patronais e aparecia na primeira Agenda da CNF em 2011, sendo reiterado durante todos os anos seguintes. Torna-se, assim, relevante demonstrar qual foi a posição da CNF, a partir do início do primeiro governo Dilma, e a evolução dos debates promovidos por esta entidade sobre as questões trabalhista e sindical na conjuntura de emergência de uma crise econômica que se combina com uma crise política, produzindo como resultado um golpe de Estado contra o governo Dilma e as condições fundamentais para a implementação de um novo ciclo de contrarreformas constitucionais neoliberais.
O exame das entidades financeiras representadas pela CNF possibilita-nos observar quais mudanças ocorreram ao longo dos anos 2010. Entre abril de 2011 e março de 2014, as seguintes entidades tinham assento como membros natos no Conselho de Representantes da CNF: Associação Brasileira de Bancos (ABBC); Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (ABECIP); Associação Brasileira das Empresas de Leasing (ABEL); Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (ACREFI); Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA); Associação Nacional das Corretoras e Distribuidoras de Títulos de Valores, Câmbio e Mercadorias (ANCORD); e Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN).
A partir de abril de 2014, a Associação Brasileira de Bancos Internacionais (ABBI) passou a integrar a CNF. Em abril de 2017, outra entidade ingressou em seu Conselho de Representantes: a Brasil, Bolsa, Balcão ([B]³), resultante da fusão, em março de 2017, da Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos Privados (CETIP) e da BM&F Bovespa, empresa que se situa como uma das cinco maiores bolsas do mercado de capitais e financeiro do mundo.7
De modo geral, as entidades associadas à CNF tendem a representar os seguintes segmentos do sistema financeiro: bancos de médio porte (ABBC), grandes bancos comerciais (FEBRABAN), bancos estrangeiros (ABBI), bancos de investimento (ANBIMA), corretoras (ACORD), operadoras de leasing (ABEL), empresas de crédito e financeiras (ABECIP e ACREFI) e empresas de mercado de capitais (B³). No entanto, ao observarmos o histórico das presidências da CNF no período de 2011 a 2021, constatamos que prevalece a representação dos grandes bancos comerciais (FEBRABAN), alternando-se, com o passar dos anos, a presença de dirigentes mais vinculados a um banco nacional ou a um banco estrangeiro: Fabio Coletti Barbosa/Santander/FEBRABAN (abril a outubro de 2011), Luiz Carlos Trabuco Cappi/Bradesco/FEBRABAN (outubro de 2011 a março de 2017) e Sérgio Agapito Lires Rial/Santander/FEBRABAN (abril de 2017 a março de 2023). Na vice-presidência, figurou a presença de Marcelo Fidêncio Giufrida, vinculado à ANBIMA (abril de 2011 a março de 2014), e de Érico Sodré Quirino Ferreira, dirigente da ACREFI (abril de 2014 março de 2017).8 A presidência da Direção Executiva da CNF seguiu a mesma alternância da presidência do Conselho de Representantes até março de 2017, sendo assumida a partir de então por José Ricardo da Costa Aguiar Alves, que vinha atuando na vice-presidência dessa Diretoria desde 2007 e se caracteriza como uma espécie de CEO da CNF, desempenhando também a função de Conselheiro Sênior do Banco Mundial e de representante do Brasil no Conselho Econômico e Social da ONU.9
Na condução política da CNF, salta à vista a predominância dos representantes dos grandes bancos comerciais. Este setor é marcado por um forte processo de concentração e centralização de capitais (MINELLA, 2007; METZNER; MATIAS, 2015; MACIEL et al, 2021) e emprega um número maior de trabalhadores quando comparado aos demais segmentos do sistema financeiro — na lista das 50 empresas que mais contratam trabalhadores no país, se observarmos as empresas que integram o sistema financeiro nacional, é possível verificar a presença de três bancos privados (Itaú Unibanco, Bradesco e Santander) e um banco estatal (Banco do Brasil) (ALVARENGA, 2019).10
Em sua relação com os trabalhadores e enquanto representante dos interesses do capital financeiro, a CNF adota uma postura socialmente conservadora que visa a conter qualquer tipo de ampliação dos direitos sociais e trabalhistas. A partir do exame dos documentos da CNF referentes às questões trabalhista e sindical, é possível afirmar que a entidade desempenhou um papel decisivo na aprovação da contrarreforma trabalhista e, após a implementação da nova legislação, continuou atuando em prol do desmonte dos direitos trabalhistas. Ademais, a CNF atuou fortemente para aprovar o primado do negociado sobre o legislado, com o objetivo de obstruir e criar dificuldades à ação reivindicatória dos trabalhadores, em especial das categorias profissionais que demonstraram historicamente ter menor capacidade de mobilização e de organização perante as entidades patronais.
No levantamento bibliográfico que fizemos sobre as pesquisas que abordam as entidades de representação do capital financeiro, identificamos apenas três trabalhos monográficos que tomam a CNF como objeto de estudo principal, sendo um mestrado (AGUIAR JR., 2015) e dois trabalhos de conclusão de curso da graduação (SILVA, 2015; HAMON, 2016), mas nenhum deles dá centralidade ao debate sobre as questões trabalhista e sindical.11 Os demais trabalhos de que tivemos ciência referem-se à CNF de maneira muito pontual (DIAS, 2012; VALLE, 2019) ou como parte de um conjunto de entidades que representam as instituições financeiras no país, como, por exemplo: Minella (1994, 2007). Nestas quatro últimas referências, os direitos trabalhistas não ocupam um lugar de destaque, sendo priorizados temas mais relacionados à política econômica ou à representação do setor financeiro. Nos estudos sobre a reforma trabalhista mais recente, identificamos apenas um artigo e uma tese do mesmo autor que se dedicou à análise do posicionamento de entidades patronais em audiência realizada na Câmara dos Deputados, em março de 2017, da qual participou um representante da CNF/FEBRABAN (BEVILAQUA, 2018; 2020).
Chama-nos a atenção também que num dos principais documentos de análise crítica à reforma trabalhista, formulado pelo Centro de Estudos Sindicais e do Trabalho (CESIT/Unicamp), os redatores observam que vários argumentos que deram subsídio ao projeto de lei e ao texto substitutivo, estavam presentes em documentos de entidades patronais como: a Confederação Nacional da Indústria (CNI) — “101 Propostas de Modernização Trabalhista”, 2012; “Agenda Legislativa da Indústria”, 2014; “Caminhos da Modernização Trabalhista”, 2016 — e a Confederação Nacional da Agricultura e da Pecuária (CNA) — “Proposta da Bancada de Empregadores”, 2016; “Balanço 2016” e “Perspectivas 2017” (Cf. TEIXEIRA et al., 2017). O que se evidencia nestes exemplos é a ausência de qualquer referência às representações das instituições financeiras, em geral, ou à CNF, em particular.
No entanto, ao nos debruçarmos sobre os documentos produzidos pela CNF na conjuntura mais recente, em especial, suas agendas que receberam inicialmente o nome de Agenda Legislativa do Setor Financeiro (2011–2014) e, posteriormente, de Agenda do Setor Financeiro (2015–2021),12 deparamo-nos com um amplo material que traduz as reivindicações de amplos segmentos financeiros e que é estruturado em mais de vinte temas, e aproximadamente duas centenas de subtemas que são ratificados, atualizados ou alterados anualmente.
Nas Agendas de 2012 a 2014, a CNF apresenta dados quantitativos acerca das proposições que a entidade vinha acompanhando no Congresso Nacional. Chamam-nos a atenção, aqui, os números de proposições referentes às questões trabalhistas e sindicais. No ano de 2012, a CNF chegou a acompanhar a tramitação de 119 proposições sobre o tema; em 2013, esse número passou para 455; e, em 2014, atingiu 583 proposições. A tabela abaixo revela esse interesse pronunciado da entidade pelas questões trabalhistas e sindicais quando comparadas às demais temáticas.13
TABELA 2 — Número de proposições monitoradas pela CNF entre 2012 e 2014
Temas monitorados | 2012 | 2013 | 2014 |
---|---|---|---|
Questões trabalhistas e sindicais | 119 | 455 | 583 |
Direitos do Consumidor | 64 | 200 | 267 |
Segurança Jurídica | 16 | 111 | 153 |
Questões tributárias | 32 | 124 | 146 |
Questões bancárias | 58 | 101 | 136 |
Eficiência econômica e competitividade | — | 96 | 114 |
Crédito Imobiliário | 40 | 77 | 106 |
Questões de Segurança | — | 90 | 105 |
Crédito | — | 70 | 81 |
Seguros e Resseguros | — | 39 | 52 |
Questões Sociais | 12 | 39 | 45 |
Questões Previdenciárias | — | 41 | 43 |
Cartões de Crédito | — | 44 | 42 |
Taxa de juros e Margens Bancárias | — | 17 | 26 |
Isonomia de tratamento | — | 7 | 14 |
Regulamentação do artigo 192 da CF | — | 6 | 12 |
Outros | — | 27 | 51 |
Elaboração própria. Dados: CNF (2012, 2013, 2014) |
Esse maior interesse pelas questões trabalhistas e sindicais é confirmado quando observamos a distribuição dos temas pelas Agendas da CNF. Nos documentos de 2011 a 2016, as questões trabalhista e sindical sempre marcaram presença como um dos três tópicos da seção “Reformas estruturais”, na qual também apareciam em destaque a “Reforma previdenciária” e a “Reforma fiscal” (concebida principalmente como controle dos gastos públicos). A partir de 2017, ano da aprovação da Lei de Terceirização e da Reforma Trabalhista, o tópico “Reformas estruturais” transforma-se em “Avanços estruturais para o desenvolvimento”, ampliando-se para sete o número de subtemas: 1. Reforma da previdência; 2. Atualização da legislação trabalhista e sindical; 3. Reforma fiscal; 4. Desindexação da economia; 5. Reformas microeconômicas; 6. Desconsideração da personalidade jurídica; 7. Reforma do processo administrativo fiscal. Em 2018, o subtema 7 passa a ser nomeado como: “Fortalecimento das instâncias administrativas tripartites”. Tais nomenclaturas se mantêm inalteradas em 2019. Nas Agendas de 2020 e 2021, a CNF volta a elaborar uma lista mais enxuta dos assim chamados “avanços estruturais”, elencando os seguintes subtemas: 1. Reforma da Previdência Social; 2. Atualização da legislação trabalhista e sindical; 3. Reforma fiscal; e 4. Qualidade e eficiência dos gastos públicos.
Além de serem tratadas como uma das reformas ou avanços estruturais, as questões trabalhista e sindical ocuparam um espaço especial nas Agendas da CNF, obtendo destaque no rol de mais de 20 temas das agendas, alcançando quase sempre o maior volume de páginas de todas suas edições anuais e reunindo um número significativo de subtemas.
Essas informações e o nível de detalhamento das propostas são suficientes para atestar a importância que as questões trabalhista e sindical têm para a atuação e o engajamento da CNF nas diferentes esferas de decisão do Estado.
Para ratificar essa compreensão, acrescentamos a esses dados a matéria publicada no site The Intercept Brasil que aferiu, pouco antes da aprovação da reforma trabalhista, que, das 850 emendas de alteração da Reforma Trabalhista apresentadas por 32 deputados na comissão especial da Câmara Federal, 34,4% delas (isto é, 292 propostas) haviam sido integralmente redigidas pela CNF e por outras três entidades patronais: a Associação Nacional de Transportes de Cargas e Logística (NT&C Logística), a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação Nacional do Transporte (CNT). Além disso, a matéria chama a atenção para o fato de que três deputados proponentes das emendas — Júlio Lopes (PP-RJ); Paes Landim (PTB-PI), o único membro da comissão especial, ainda que suplente; e Ricardo Izar (PP-SP) — haviam recebido doações de campanha de empresas como: Bradesco, Itaú Unibanco, Santander, Safra, entre outras instituições ligadas ao setor financeiro (MAGALHÃES et al., 2017). Esses elementos evidenciam o forte interesse e empenho da CNF pela aprovação da Reforma Trabalhista.
Como observamos acima, as questões trabalhista e sindical sempre foram tratadas pela CNF como temas estruturais, sendo inseridas em todos os documentos analisados como item da seção “Reformas estruturais” (2011–2016) ou da seção “Avanços estruturais para o desenvolvimento” (2017–2021). Esta é uma parte da Agenda da CNF em que os princípios mais gerais sobre o tema trabalhista e sindical são publicizados e que orientam o detalhamento das propostas que aparecerão em outra seção, intitulada “Questões trabalhista e sindical”.
Analisando essa parte dos princípios, notamos a manutenção de praticamente o mesmo texto base, que sofrerá uma alteração mais significativa apenas a partir da Agenda de 2017, ano em que é aprovada a Reforma Trabalhista. Quais são os princípios orientadores que a CNF defende para discutir as questões trabalhista e sindical no Brasil?
A abrangência dos direitos trabalhistas é uma das questões que mais preocupam a CNF. Na visão dessa entidade, o excesso de direitos trabalhistas compromete a geração de empregos, a competitividade das empresas e o crescimento econômico, devendo, portanto, esses direitos serem flexibilizados e debatidos por meio de negociações coletivas. Isto se traduz claramente nas seguintes passagens das agendas: “No cenário inverso [cenário de crise], a exacerbação desmesurada de direitos trabalhistas aumentaria exageradamente os custos de contratação e reduziria tanto a oferta de emprego quanto o próprio crescimento econômico” (CNF, 2011, p. 42; 2012, p. 50; 2013, p. 59; 2014, p. 62; 2015, p. 64; 2016, p. 74; 2017, p. 30); ou, com a alteração da redação, a partir de 2018, “No cenário inverso [cenário de crise], o excesso de regramentos trabalhistas engessa a economia e aumentaria os custos de contratação, reduzindo tanto a oferta de emprego quanto o próprio crescimento econômico” (CNF, 2018, p. 34; 2019, p. 30; 2020, 26; 2021, p. 25).
Em outros trechos, a visão negativa da CNF acerca dos direitos trabalhistas é reforçada na medida em que reivindicam uma reforma trabalhista e sindical: “sem implicar custos de contratação irrealistas e exorbitantes que prejudiquem a geração de empregos e o crescimento econômico” (CNF, 2011, p. 45; 2012, p. 50; 2013, p. 59; 2014, p. 62; 2015, p. 64; 2016, p. 74; 2017, p. 29–30). Tal trecho passa a receber a seguinte redação após a aprovação da Reforma Trabalhista: “sem implicar custos de contratação, pois prejudicam a geração de empregos e o crescimento econômico” (CNF, 2018, p. 33; 2019, p. 30; 2020, p. 25; 2021, p. 25).
De acordo com a CNF, os direitos trabalhistas devem ser tratados como algo “desmesurado”, “exagerado”, “excessivo”, “irrealista” e “exorbitante” e, portanto, como prejudiciais para o bom funcionamento da economia. Ocorre que dados do relatório Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no período base de 2015 a 2019, indicam que os problemas ligados às questões trabalhistas não decorrem do excesso de direitos, mas de seu não cumprimento por parte das empresas. A grande maioria dos processos ingressados tanto na Justiça do Trabalho quanto no Poder Judiciário concentra-se no assunto “Rescisão do contrato de trabalho/verbas rescisórias”, designando o não pagamento de verbas rescisórias (CNJ, 2016; 2017; 2018; 2019; 2020).
Tais dados nos levam a observar que o que há de “desmesurado” e “exorbitante” são as exigências da CNF que apontam para mudanças na legislação trabalhista a fim de legitimar não só o não cumprimento dos direitos assegurados aos trabalhadores, como também a primazia do negociado sobre o legislado — primazia que, distante de garantir compromissos entre partes em condição de igualdade, possibilita às entidades patronais e às empresas exercerem maior pressão sobre os trabalhadores com vistas a contemplarem seus interesses particulares e imporem medidas que resultem na deterioração das condições de reprodução da força de trabalho no país, em particular dos trabalhadores que manifestam no plano da luta sindical menor capacidade de mobilização e de organização.
Como nos lembra Miliband (1972), em sua crítica à teoria pluralista, seja no interior do Estado ou no âmbito da empresa, a competição entre capitalistas e trabalhadores é sempre “imperfeita”, desigual, na sociedade capitalista. Poderíamos acrescentar a essa tese o argumento de que no seio das próprias classes trabalhadoras há desigualdades de força nas lutas de resistência que travam contra os ataques dos capitalistas e/ou nas lutas pela ampliação dos direitos sociais e trabalhistas, a tal ponto que o primado do negociado sobre o legislado pode ser sustentado por certas categorias que conseguem obter vantagens econômicas, dada a capacidade de luta que lograram construir histórica e territorialmente.
Possivelmente ludibriando essa realidade dos fatos, a CNF salienta que a criação de empregos e a organização de uma economia “dinâmica e competitiva” poderão ser garantidas mediante a flexibilização da legislação trabalhista e o estabelecimento do primado do negociado sobre o legislado nas relações trabalhistas. No entendimento dessa entidade, há uma correlação direta entre flexibilização das leis trabalhistas e redução dos níveis de desemprego.
Tal entendimento é ratificado pelo representante da CNF/FEBRABAN, Damião Cordeiro, em audiência pública realizada na Câmara dos Deputados, em 8 de março de 2017.14 Para ele, o aumento do desemprego seria resultado de uma legislação que “protege muito o trabalhador, mas, por outro lado, retira dele exatamente o maior bem que ele tem: o emprego” (CORDEIRO, 2017, p. 3). Cordeiro argumenta que a legislação trabalhista rígida só contribuiria para o crescimento de ações judiciais na Justiça do Trabalho, o que encareceria os custos de contratação: “Quanto maior o ativismo judicial, mais cara será a contratação de um empregado” (CORDEIRO, 2017, p. 45). Para esse representante do capital financeiro, os trabalhadores terão que escolher entre ter direitos ou ter empregos, ou seja, o emprego é considerado aqui como uma alternativa aos direitos trabalhistas, ou ainda, como observa Bevilaqua (2018), é tratado sob o prisma da lógica mercantil como um “bem”, uma “coisa” ou uma “posse”, discurso que reapareceria pouco tempo depois na campanha eleitoral e nos pronunciamentos públicos do presidente Jair Bolsonaro (2018; 2019; 2020; 2021).
Sobre a relação entre redução de direitos e aumento de emprego, a CNF incorre na apresentação de argumentos falaciosos, tendo em que vista que as taxas de desemprego se mantiveram altas e estáveis mesmo após a aprovação da Reforma Trabalhista de 2017, oscilando da seguinte forma nos quatro trimestres dos anos considerados, conforme dados da PNAD Contínua (2021): 2015 (mín. de 7,9%, máx. de 8,9%), 2016 (mín. de 10,9%, máx. de 12,0%), 2017 (mín. de 11,8, máx. de 13,7%), 2018 (mín. de 11,6%, máx. de 13,1%), 2019 (mín. de 11,0%, máx. de 12,7%), 2020 (mín. de 12,2%, máx. de 14,6%). Como podemos observar, a menor taxa mínima trimestral de desemprego registrada desde 2017 foi de 11,0%, número 3,1% superior à taxa mínima de desemprego registrada em 2015, antes do golpe contra o governo Dilma Rousseff. Ressaltamos ainda que, no primeiro trimestre de 2021, o desemprego atingiu a maior marca: 14,7%, considerando-se a série desde o primeiro trimestre de 2021.
Se analisarmos dados dos três maiores bancos comerciais privados (Bradesco, Itaú Unibanco e Santander) no período de 2011 a 2020, é possível constatar um crescimento expressivo do lucro líquido obtido por essas instituições financeiras, ao mesmo tempo que há uma tendência de queda gradual do número de empregados desses bancos — vejam-se as tabelas 3 e 4 abaixo. Tais dados sugerem que o interesse maior dos grandes proprietários desses bancos não é o de garantir o emprego dos trabalhadores, mas de auferir lucros “exorbitantes”, mesmo em situação de crise econômica, aumentar a produtividade de seus empregados e exercer maior controle e disciplina sobre os trabalhadores nas empresas pela via da adoção de políticas recessivas que estimulam o crescimento do desemprego.
Se, como já destacamos, a primazia do negociado sobre o legislado tende a enfraquecer a posição dos trabalhadores na defesa de seus direitos, na medida em que as negociações coletivas entre capitalistas e trabalhadores são atravessadas por partes desiguais em termos de recursos econômicos e políticos, o crescimento do desemprego tanto numa categoria específica quanto na sociedade brasileira em geral (como tem ocorrido desde 2015) tende a criar significativas dificuldades para a organização sindical dos trabalhadores, uma vez que as ameaças de desemprego e de corte salariais geram no trabalhador uma indisposição para a luta sindical, produzindo um cenário de queda do número de greves.
No Brasil, os números de greves e de horas paradas caíram significativamente desde que atingiram um pico em 2016, ano em que se registraram 2.093 greves e 140.214 horas paradas. Nos anos seguintes, esses números foram, respectivamente, de: 1.566/94.066 (2017), 1.453/69.233 (2018), 1.118/44.650 (2019) e 649/19.486 (2020), além de se manifestarem predominantemente como greves defensivas, visto que estavam voltadas para a defesa da manutenção e do cumprimento dos direitos e condições de trabalho vigentes (DIEESE, 2018a; 2019a; 2020a; 2021a).
TABELA 3 — Número de empregados dos três maiores bancos no Brasil (2011–2020)
Banco | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | 2017 | 2018 | 2019 | 2020 |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Bradesco | 104.684 | 103.385 | 100.489 | 95.520 | 92.861 | 108.793 | 98.808 | 98.605 | 97.329 | 89.575 |
Itaú Unibanco | 98.258 | 90.323 | 95.696 | 93.175 | 83.481 | 80.871 | 85.537 | 86.801 | 81.691 | 83.919 |
Santander | 54.564 | 53.992 | 49.621 | 49.309 | 50.024 | 47.254 | 47.404 | 48.012 | 47.819 | 44.599 |
Elaboração própria. Fonte: DIEESE (2013; 2015; 2016; 2017b; 2018b; 2019b; 2020b; 2021b) |
TABELA 4 — Lucro líquido dos três maiores bancos privados em exercício no Brasil (2011–2020) — em bilhões R$
Banco | 2011 | 2012 | 2013 | 2014 | 2015 | 2016 | 2017 | 2018 | 2019 | 2020 |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Bradesco | 11,1 | 11,5 | 12,2 | 15,4 | 17,8 | 17,1 | 19,0 | 21,5 | 25,8 | 19,4 |
Itaú Unibanco | 14,6 | 14,3 | 15,8 | 20,6 | 23,8 | 22,1 | 24,8 | 25,7 | 28,3 | 18,9 |
Santander | 6,6 | 6,3 | 5,7 | 5,9 | 6,6 | 7,3 | 9,9 | 12,3 | 14,5 | 13,8 |
Elaboração própria. Fonte: DIEESE (2013; 2015; 2016; 2017b; 2018b; 2019b; 2020b; 2021b) |
Analisando os temas mais recorrentes nas Agendas da CNF, observamos que, na seção “Reformas estruturais” da Agenda de 2011, a CNF destaca o que pode ou não ser flexibilizado nos dispositivos ligados aos direitos trabalhistas e previstos no art. 7 º da Constituição Federal. De acordo com essa entidade, 20 incisos poderiam ser flexibilizados:
I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; V - piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho; VI - irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo; VIII - décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria; IX - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno; X - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa; XI - participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei; XII - salário-família pago em razão do dependente do trabalhador de baixa renda nos termos da lei; XIII - duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho; XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva; XV - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal; XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal; XIX - licença-paternidade, nos termos fixados em lei; XX - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei; XXI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei; XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei; XXV - assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até 5 (cinco) anos de idade em creches e pré-escolas; XXVII - proteção em face da automação, na forma da lei; XXXIV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso (CNF, 2011, p. 44-45)
Já, para a entidade, outros 13 incisos do mesmo artigo da Constituição Federal não deveriam ser flexibilizados:
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; III - fundo de garantia do tempo de serviço; IV - salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim; VII - garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remuneração variável; XVIII - licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias; XXIV - aposentadoria; XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho; XXVIII - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa; XXIX - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho; XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil; XXXI - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência; XXXII - proibição de distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos; XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos (CNF, 2011, p. 45).
Nas Agendas seguintes, a CNF prega a construção de “relações de trabalho flexíveis, compatíveis com uma economia dinâmica e competitiva” (CNF, 2012, p. 51; 2013, p. 60; 2014, p. 63; 2015, p. 65; 2016, p. 75; 2017, p. 31). A partir de 2018, a CNF passa a sustentar que a aprovação da Lei 13.467/2017, ou seja, que a contrarreforma trabalhista do governo Temer, garantirá tais resultados e trará segurança jurídica para as relações de trabalho, não devendo se tornar “objeto de reapreciação” (CNF, 2018, p. 34; 2019, p. 30-31; 2020, p. 26; 2021, p. 26). Sobre a segurança jurídica, é importante salientar que a CNF sempre reitera o entendimento de que ela só poderia ser assegurada, se os contratos de trabalho fossem flexibilizados — o que implicaria redução de direitos trabalhistas e de encargos deles decorrentes para as empresas — e a negociação coletiva tivesse primazia sobre a legislação trabalhista — o que envolveria reduzir o máximo possível a intervenção do Estado sobre as relações de trabalho e garantir, assim, maiores possibilidades para os capitalistas disciplinarem os trabalhadores, dadas as assimetrias de poder e de pressão que possuem as entidades patronais e os sindicatos dos trabalhadores nas negociações e acordos coletivos.
No que se refere à questão mais propriamente sindical, a CNF faz a defesa enfática da unicidade sindical, criticando a Portaria nº 186 do Ministério do Trabalho, de 10 de abril de 2008, que teria criado as condições para a abertura de mais de um sindicato por base territorial. Isto leva a entidade a não reconhecer a legalidade dessa portaria (CNF, 2011; 2012; 2013; 2014; 2015; 2016; 2017; 2018; 2019).
Cabe salientar que todas as Agendas da CNF publicadas a partir de 2012 indicam uma lista mais enxuta de temas prioritários, os quais são apresentados na seção “Reformas estruturais” ou “Avanços estruturais para o desenvolvimento”. O modo de apresentação desses temas é distinto do presente na Agenda de 2011, na qual a entidade elenca todos os incisos do art. 7º da Constituição Federal que precisam ou não ser alterados.
QUADRO 1 — Propostas de reforma trabalhista defendidas pela CNF (2012–2021)
Ano | Propostas de reforma trabalhista | Alterações em relação ao ano anterior |
---|---|---|
2012 | 1. despedida arbitrária ou sem justa causa 2. participação nos lucros ou resultados 3. duração da jornada de trabalho 4. fracionamento de férias 5. proteção do mercado de trabalho da mulher 6. adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas 7. igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador terceirizado 8. multa sobre o fundo de garantia do tempo de serviço |
|
2013 | 1. despedida arbitrária ou sem justa causa 2. participação nos lucros ou resultados 3. duração da jornada de trabalho 4. fracionamento de férias 5. proteção do mercado de trabalho da mulher 6. adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas 7. igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador terceirizado 8. multa sobre o fundo de garantia do tempo de serviço |
Nenhuma |
2014 | 1. participação nos lucros ou resultados 2. duração da jornada de trabalho 3. fracionamento de férias 4. proteção do mercado de trabalho da mulher 5. terceirização 6. multa sobre o fundo de garantia do tempo de serviço |
Os seguintes itens deixaram de ser mencionados: “despedida arbitrária ou sem justa causa” “adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas” A redação do seguinte item foi modificada: “igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador terceirizado” Nova redação: “terceirização” |
2015 | 1. duração da jornada de trabalho 2. fracionamento de férias 3. proteção do mercado de trabalho da mulher 4. terceirização 5. multa sobre o fundo de garantia do tempo de serviço |
Os seguintes itens deixaram de ser mencionados: “participação nos lucros ou resultados” |
2016 | 1. duração da jornada de trabalho 2. fracionamento de férias 3. proteção do mercado de trabalho da mulher 4. terceirização 5. multa sobre o fundo de garantia do tempo de serviço |
Nenhuma |
2017 | 1. fortalecimento das negociações coletivas 2. flexibilização da jornada de trabalho 3. fracionamento de férias 4. proteção do mercado de trabalho da mulher 5. terceirização 6. multa sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) |
O seguinte item foi incluído: “fortalecimento das negociações coletivas” A redação do seguinte item foi modificada: “duração da jornada de trabalho” Nova redação: “flexibilização da jornada de trabalho” |
2018 | 1. fortalecimento das negociações coletivas 2. flexibilização da jornada de trabalho 3. fracionamento de férias 4. proteção do mercado de trabalho da mulher 5. teletrabalho (Home Office) 6. rescisão de contrato de trabalho “de Comum Acordo” 7. cláusula de arbitragem 8. trabalho em regime de tempo parcial 9. terceirização |
O seguinte item deixou de ser mencionado: “multa sobre o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS)” Os seguintes itens foram incluídos: “teletrabalho (Home Office)” “rescisão de contrato de trabalho ‘de Comum Acordo’” “cláusula de arbitragem” “trabalho em regime de tempo parcial” |
2019 | 1. fortalecimento das negociações coletivas 2. flexibilização da jornada de trabalho 3. fracionamento de férias 4. proteção do mercado de trabalho da mulher 5. teletrabalho (Home Office) 6. rescisão de contrato de trabalho “de Comum Acordo” 7. cláusula de arbitragem 8. trabalho em regime de tempo parcial 9. terceirização |
Nenhuma |
2020 | 1. fortalecimento das negociações coletivas 2. flexibilização da jornada de trabalho 3. fracionamento de férias 4. proteção do mercado de trabalho da mulher 5. teletrabalho 6. rescisão de contrato de trabalho “de Comum Acordo” 7. cláusula de arbitragem 8. trabalho em regime de tempo parcial 9. terceirização |
Nenhuma A expressão Home Office foi retirada do item 5 |
2021 | 1. fortalecimento das negociações coletivas 2. flexibilização da jornada de trabalho 3. fracionamento de férias 4. proteção do mercado de trabalho da mulher 5. teletrabalho 6. rescisão de contrato de trabalho “de Comum Acordo” 7. cláusula de arbitragem 8. trabalho em regime de tempo parcial 9. terceirização |
Nenhuma |
Elaboração própria. Fonte: CNF (2012–2021). |
Como já observamos, desde 2017, a parte referente às questões trabalhista e sindical da seção das mudanças estruturais ganha outro nome e passa a incluir o detalhamento de uma série de medidas, tais como: 1. Código do trabalho; 2. Criação do conselho administrativo de recursos trabalhistas e suas juntas de julgamentos; 3. Utilização dos recursos do FGTS; 4. Contribuição social sobre o FGTS; 5. Terceirização; 6. Trabalho temporário; 7. Trabalho intermitente; 8. Suspensão de contrato de trabalho em caso de crise econômico-financeira. Quais são as noções estruturantes que orientam o conjunto desses oito eixos sustentados pela CNF?
No geral, os oitos eixos acima podem ser agrupados da seguinte maneira:
fortalecimento do poder patronal sobre a regulamentação das relações de trabalho — o que pode ser observado nos itens referentes ao código de trabalho, que toma como questão central o “fortalecimento da negociação coletiva”, e à criação do conselho administração de recursos trabalhistas e suas juntas de julgamentos o qual questiona o poder “monocrático” do Ministério do Trabalho de autuar as empresas e julgar os processos e indica como alternativa a constituição de um órgão paritário formado por representantes dos empresários e dos trabalhadores a partir de listas tríplices a serem enviadas ao Ministério do Trabalho, a quem caberia “a escolha dos componentes do órgão e a designação de membro para a presidência dos trabalhos” (CNF, 2017, p. 32). O item 8 também se enquadra nesse primeiro grupo e se refere à suspensão do contrato de trabalho mediante acordo coletivo em situação de crise econômico-social;
transferência de recursos do FGTS para o pagamento de dívidas e compra ações, como prevê o item sobre a utilização dos recursos do FGTS. Isto poderia favorecer fundamentalmente as instituições financeiras, na medida em que contribuiria para conter a inadimplência dos trabalhadores endividados e aquecer a procura pelo mercado acionário;
precarização dos contratos de trabalho por meio da aplicação da terceirização às atividades meio e fim (itens 1 e 5), da desvinculação do pagamento do vale-transporte dos salários (item 1), da adoção do contrato temporário e intermitente (itens 6 e 7), da flexibilização da jornada de trabalho, via parcelamento das férias (item 1) ou ajuste da jornada de trabalho de acordo com as demandas do empregador (item 7);
desoneração fiscal das empresas por meio da retirada de encargos trabalhistas sobre a PLR (item 1) e da extinção da contribuição de 10% sobre a multa rescisória do FGTS (item 4).
Como os conteúdos dos itens 1 (código do trabalho), 5 (terceirização), 6 (trabalho temporário) e 7 (trabalho intermitente) foram em grande medida atendidos pela Lei de Terceirização e pela Reforma Trabalhista de 2017, eles deixam de figurar na Agenda de 2018, sendo os demais mantidos. A Agenda de 2019 retira o item Suspensão de contrato de trabalho em caso de crise econômico-financeira, muito provavelmente por conta de o país apresentar uma leve recuperação econômica, conforme o PIB registrado em 2017 (1,3%) e em 2018 (1,8%), e pelo fato de o debate sobre o projeto de lei referente à matéria apresentado em 2015 não avançar internamente nas decisões da Câmara dos Deputados. Em 2020, a CNF insere na Agenda o “Contrato Verde e Amarelo”, Medida Provisória nº 905, editada pelo governo Bolsonaro em 2019, e mantém os itens: criação do conselho administrativo de recursos trabalhistas e suas juntas de julgamentos e utilização dos recursos do FGTS, e incorpora o item contribuição social sobre o FGTS à discussão sobre o Contrato Verde e Amarelo. Na Agenda de 2021, a entidade mantém os mesmos itens reivindicados em 2020.
O “Contrato Verde e Amarelo” é defendido pela CNF como uma maneira de reduzir a informalidade. Ainda segundo a entidade, esse modelo de contrato “sem excluir direitos clássicos do trabalhador tais como férias, 13º salário e descanso semanal, [...] apresenta novas tratativas para essas mesmas questões à luz das mudanças advindas das recentes reformas aprovadas pelo Congresso Nacional” (CNF, 2020, p. 27; 2021, p. 26).
Entre outras medidas, o “Contrato Verde e Amarelo” reduziria para 2% a contribuição para o FGTS; promoveria isenção das alíquotas do Sistema S, do salário-educação e da contribuição patronal de 20% para a Seguridade Social; e extinguiria a obrigatoriedade da multa em caso de rescisão sem justa causa. José Ricardo Alves, presidente-executivo da CNF e Murilo Portugal, presidente da FEBRABAN, acompanharam o evento de lançamento do “Contrato Verde e Amarelo” promovido pelo Governo Federal (CNF/PODER EXECUTIVO, 2019).
Na seção “Questões trabalhista e sindical”, a quantidade de subtemas abordados varia de 22 a 35, sendo que 15 subtemas marcaram presença em todas as agendas: 1. participação dos trabalhadores na gestão da empresa; 2. jornada de trabalho; 3. fixação do piso salarial; 4. estabilidade da relação empregatícia; 5. estabilidade provisória da relação empregatícia; 6. acidente de trabalho; 7. seguro acidente de trabalho (SAT); 8. Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT); 9. licença maternidade; 10. outras licenças trabalhistas; 11. adicional de penosidade; 12. assédio moral; 13. acesso das entidades sindicais às informações das empresas; 14. ultratividade dos acordos; e 15. convenções e contratos coletivos de trabalho.
Apesar de haver pouca mudança na redação dos textos das agendas legislativas ao longo dos anos, é possível perceber que a CNF acompanha de perto a questão, já que, quando um tópico ou parte dele é contemplado por uma mudança na legislação, a reivindicação é retirada ou reformulada na Agenda.
Nas Agendas de 2011 a 2017 (publicada antes da concretização da Reforma Trabalhista), o texto introdutório do tópico sobre a Reforma Trabalhista era o seguinte:
Para a Confederação Nacional das Instituições Financeiras, podem ser introduzidas profundas melhorias na legislação que rege as relações de trabalho, por meio de uma proposta de reforma trabalhista ou por intermédio de projetos pontuais. Tais melhorias, sem reduzir os direitos dos trabalhadores, devem estar voltadas para relações de trabalho transparentes, lastreadas em segurança jurídica para todas as partes e flexíveis, que estimulem as empresas a inovar, a aumentar sua produtividade, a crescer e a que se tornem mais competitivas. Com isso, gera-se maior número de empregos formais e promove-se o trabalho decente e produtivo, a extensão da proteção social, bem como o fortalecimento do diálogo social. Os instrumentos mais adequados para atingir esses objetivos são as convenções e os acordos coletivos de trabalho, ao lado de dispositivos legais que incentivem a concessão voluntária de direitos trabalhistas por parte dos empregadores. (CNF, 2011, p. 105; 2012, p. 126; 2013, p. 183; 2014, p. 185; 2015, p. 207; 2016, p. 235; 2017, p. 259).
Na Agenda de 2018, a introdução das questões trabalhista e sindical já aponta para as “melhorias” que serão geradas pela Reforma Trabalhista de 2017:
Para a Confederação Nacional das Instituições Financeiras, a nova lei trabalhista trará profundas melhorias nas relações de trabalho. Tais melhorias possuem como objetivo a garantia de relações de trabalho transparentes, lastreadas em segurança jurídica para todas as partes e flexíveis, estimulando o crescimento econômico e a competitividade. Os instrumentos mais adequados que irão ajudar a atingir esses objetivos são as convenções e os acordos coletivos de trabalhos (CNF, 2018, p. 257).
O texto introdutório da seção “Questões trabalhista e sindical”, modificado em 2018, permanece inalterado até a Agenda de 2021. Entre os anos de 2016 e 2018, uma série de temas-chave para a CNF foi alvo de reformulações por parte do Congresso Nacional. O tema da terceirização, por exemplo, esteve presente nas Agendas de 2011 a 2016. Na Agenda de 2017, a temática já não aparece mais como um tópico destacado, pois tal Agenda foi publicada em período posterior à sanção presidencial da lei 13.429/2017 (Lei da Terceirização).
A aprovação da lei da terceirização, que permitiu a contratação de trabalhadores terceirizados para a execução de atividade-fim da empresa, atendeu em grande parte às reivindicações da CNF no que se referia ao tema. Para a entidade as regras para terceirização deveriam, entre outras coisas, conceder às empresas uma ampla margem para decidir quais atividades terceirizar; atribuir responsabilidade subsidiária aos contratantes pelas obrigações trabalhistas; e também admitir a hipótese de empresas contratadas prestarem serviços especializados não limitados a um único objeto social (CNF, 2012, p. 129; 2013, p. 189; 2014, p. 187; 2015, p. 209; 2016, p. 237)
Outra temática que deixa de ter um tópico específico na Agenda de 2017 é a “contribuição social sobre o FGTS”, sendo mencionada apenas no texto referente aos “avanços estruturais”. Segundo a CNF, a cobrança da multa de 10% em demissão sem justa causa teria perdido seu propósito quando foram recuperadas as perdas geradas com os planos Verão e Collor I. Em outubro de 2013, as confederações patronais ajuizaram ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (CNF, 2016). A cobrança foi extinta com a Lei nº 13.932/2019.15
Outro tópico suprimido a partir das Agendas de 2017 refere-se à suspensão do contrato de trabalho em caso de crise econômico-financeira, que permanece como subtema da seção “avanços estruturais” até a Agenda de 2018. A CNF reivindicava a introdução na legislação trabalhista de um dispositivo que permitisse a suspensão do contrato em momentos de crise financeira, mediante previsão em convenção ou acordo coletivo. Em maio de 2015, foi aprovada a tramitação no Senado do Projeto de Lei do Senado nº. 62, de 2013, transformado em Projeto de Lei 1.875, que autoriza tal suspensão. Em março de 2021, foi designado um novo relator para esse PL na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público do Senado.
Nas Agendas de 2012 a 2016 aparece o tópico “Contribuição negocial” que trata da contribuição sindical obrigatória. A CNF manifesta sua contrariedade ao desconto obrigatório da contribuição sindical. Na Reforma Trabalhista de 2017, foi aprovada a suspensão da cobrança compulsória para todos os trabalhadores, sendo o financiamento das entidades sindicais feito apenas por trabalhadores sindicalizados e com cobrança autorizada. Na Agenda de 2018, foi introduzido o tópico “financiamento e representatividade de entidades sindicais”, que, em grande parte, reforça o que vinha sendo defendido nas Agendas anteriores sobre a importância da “liberdade” de associação sindical; e deixa de aparecer a reivindicação pela unicidade sindical.
As duas temáticas centrais que aparecem na Agenda da CNF após a reforma trabalhista são o financiamento e representatividade de entidades sindicais, e o fortalecimento das negociações coletivas. A partir da Agenda de 2018, a CNF passa também a chamar atenção, positivamente (apesar da pouca modificação de texto de um ano para o outro), para a redução das ações trabalhistas ajuizadas geradas com a nova legislação trabalhista.
Por fim, cabe esclarecer que a minirreforma trabalhista, apresentada pelo governo Bolsonaro por meio da Medida Provisória nº. 1045, de 27 de abril de 2021, aprovada e convertida no Projeto de Lei de Conversão nº. 17/2021 pela Câmara dos Deputados e rejeitada pelo Senado Federal, procurava atender algumas das reivindicações da CNF, ainda que não tenhamos conseguido identificar um posicionamento público da entidade sobre o assunto. Entre as medidas previstas que atendiam as reivindicações da CNF, destacamos duas: a) o Novo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, que previa a redução da jornada de trabalho e do salário e a suspensão temporária dos contratos de trabalho. Tal programa se aprovado atenderia um princípio e uma das reivindicações que aparecem em várias Agendas da CNF, respectivamente: a “escolha” entre ter direitos e ter emprego (princípio) e a suspensão do contrato de trabalho em situações de crise econômico-financeira (reivindicação); e b) o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore), destinado a jovens entre 18 e 29 anos, com primeiro emprego com registro em carteira, e a pessoas com mais de 55 anos sem vínculo formal há mais de 12 meses. Este programa previa também uma redução dos 8% previstos na CLT da contribuição do FGTS a ser pago pelas empresas aos trabalhadores. O conteúdo deste programa já estava previsto no Contrato Verde e Amarelo, que foi apoiado pela CNF, mas não chegou a ser votado no Congresso Nacional, perdendo assim validade. Novamente, notamos aqui a tentativa de mudar a legislação trabalhista com vistas a aprofundar a retirada de direitos dos trabalhadores e que coincidem com demandas apresentadas pela CNF em suas Agendas anuais.
Ao fazermos um balanço geral das principais medidas aprovadas pela Reforma Trabalhista de 2017, é possível observar que várias reivindicações da CNF foram atendidas. Isto demonstra a influência dessa entidade no debate político nacional referente às questões trabalhista e sindical, e à prevalência de duas orientações gerais básicas na aprovação dessa contrarreforma: a política de desmonte dos direitos trabalhistas e a política de desarticulação e neutralização da ação reivindicatória dos trabalhadores via negociação coletiva.
Os debates inicialmente travados sobre a Reforma Trabalhista no âmbito da Organização Internacional do Trabalho (OIT) tendem a confirmar o diagnóstico sobre o caráter regressivo dessa contrarreforma. Quando estava tramitando como projeto de lei no Congresso Nacional, a Reforma Trabalhista brasileira foi inserida pela Comissão de Peritos da OIT como tema de discussão da 106ª. Conferência Internacional do Trabalho, ocorrida em 2017, por violar as Convenções da OIT nº. 98, 151 e 154, que tratam do direito de sindicalização e da negociação coletiva, mas o debate só foi retomado no ano seguinte, na 107ª. Conferência da OIT, ocorrida em 2018, quando a Reforma Trabalhista já havia sido aprovada. Conforme afirma Conforti (2021):
Na Conferência Internacional do Trabalho de 2018, o Brasil foi incluído na short list dos 24 países com suspeita de impor as piores condições de trabalho, tema que desperta grande interesse na OIT devido não só ao descumprimento das normas internacionais do trabalho, mas também à possibilidade de dumping social.
Considerando as alegações do governo de que a discussão sobre “o caso Brasil” era prematura e em face da controvérsia estabelecida, sobre se o país tinha ou não submetido às alterações legislativas à participação das entidades sindicais de trabalhadores, a OIT concedeu prazo para que o Brasil prestasse informações detalhadas sobre a “Reforma Trabalhista”.
Na 108ª. Conferência da OIT, realizada em 2019, o Brasil continuou fazendo parte da referida short list por conta da suspeita de graves violações cometidas pela Reforma Trabalhista de 2017, mas o tema não chegou a ser apreciado pela OIT (CONFORTI, 2021). Nessa ocasião, a comitiva de empresários brasileiros foi liderada pela CNF — o que indica o interesse e o papel destacado dessa entidade no debate sobre o tema.16 Sete confederações patronais17 chegaram a publicizar nota questionando essa decisão da OIT, alegando que a referida reforma só teria contribuído para modernizar as relações de trabalho e para reforçar a proteção ao trabalhador (CNA et al., 2019).
No ano seguinte, por conta da pandemia, a OIT cancelou a realização de sua Conferência anual. Em 2021, o Brasil deixou de integrar a short list, voltando a integrar a lista dos 40 países que poderiam ter cometido algum tipo de violação contra as Convenções da OIT. Isso não indica que a OIT teria retificado completamente sua posição inicial e passado a considerar que as mudanças promovidas pela Reforma Trabalhista de 2017 não teriam violado os acordos internacionais. Como novamente observa Conforti (2021), o governo brasileiro ainda não deu respostas a questões de considerável importância, tais como:
1) necessidade de alteração do artigo 611-A da CLT, com a redação dada pela Reforma Trabalhista, para deixar claras as situações em que as negociações coletivas prevalecerão sobre a lei e com que alcance, assim como o pedido de informações precisas sobre o número de acordos e convenções coletivas realizadas após as alterações legislativas; 2) necessidade de alteração do parágrafo único, do artigo 444 da CLT, acerca da prevalência de acordos individuais sobre negociações coletivas para os empregados com diploma de nível superior e salário superior ao dobro do teto da Previdência Social; 3) informações sobre negociações coletivas formalizadas por entidades que representem trabalhadores autônomos; d) informações acerca do alcance e efeitos concretos dos artigos 620 e 623 da CLT, sobre a prevalência de acordos coletivos em relação às convenções coletivas de trabalho e nulidades de cláusulas convencionais que contrariam normas de política econômico-financeira do governo ou política salarial vigente no país, respectivamente (CONFORTI, 2021).
Tais questionamentos contribuem para colocar em dúvida o caráter supostamente modernizador da Reforma Trabalhista de 2017 e reforçam o entendimento sobre seu papel na desconstrução dos direitos trabalhistas e na imposição de severos limites à ação reivindicatória dos trabalhadores, políticas que foram e são apoiadas com entusiasmo pela CNF e pelas entidades que conformam o assim chamado “Setor financeiro”.
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* Agradecemos a Andréia Galvão pelo envio de materiais referentes à Reforma Trabalhista de 2017, que foram bastante úteis para a construção deste artigo.↩︎
Para um balanço das polêmicas sobre a caracterização do impeachment de Dilma Rousseff e para uma análise deste acontecimento como golpe de Estado, ver: Martuscelli (2020). Sobre o conceito de golpe de Estado, ver Martuscelli (2018).↩︎
De acordo com a Secretaria do Tesouro Nacional, os grupos de detentores da DPMFi são constituídos pelas seguintes instituições: Instituições financeiras (carteira própria de bancos comerciais e de investimentos, nacionais ou estrangeiros, corretoras e distribuidoras, além de bancos estatais e BNDES); Fundos de investimentos (aplicações de títulos da dívida pública feitos por Fundos de investimentos, excetuando as aplicações feitas pelas instituições financeiras); Fundos de Previdência (Previdência aberta, fechada e Regime Próprios de Previdência Social); Não residentes (“contas de pessoas físicas ou jurídicas, dos fundos ou de outras entidades de investimento coletivo, com residência, sede ou domicílio no exterior”, reguladas pela Carta-Circular nº 3.278, de 18 de junho de 2007); Seguradoras (seguradoras e resseguradoras) e Outros. Na análise dos “dealers” das negociações da dívida pública interna brasileira no período de 2011 a 2021, pudemos identificar a presença destacada das seguintes instituições: Banco Bradesco (banco comercial nacional), BTG Pactual (banco de investimentos nacional), Banco do Brasil (banco estatal nacional), Banco Santander (banco comercial estrangeiro), Bank of America Merrill Lynch (banco de investimentos estrangeiros), Caixa Econômica Federal (banco estatal nacional), Goldman Sachs (banco de investimentos estrangeiro), Itaú Unibanco (banco comercial nacional), Renascença (distribuidora nacional) e XP investimentos (corretora nacional). Ver: Banco Central (2021) e Tesouro Nacional (2021).↩︎
Na linguagem dos credores da dívida, o cumprimento dos contratos é interpretado muitas vezes como um dos meios de garantir a segurança jurídica. A redução de direitos trabalhistas pode ser considerada outro meio fundamental para tal atingir tal objetivo.↩︎
Cabe salientar que a própria FEBRABAN é uma das entidades associadas à CNF.↩︎
Para uma análise dos conflitos envolvendo o primeiro governo Dilma e os representantes do capital financeiro, ver: Singer (2015), Vaccari (2016) e Vazquez (2020). Valle (2019) analisa o papel do capital financeiro no impeachment de Dilma.↩︎
Informações extraída de: cnf.org.br e cnf.org.br↩︎
A partir de abril de 2017, a CNF deixou de contar com a figura da vice-presidência no Conselho de Representantes.↩︎
Ver dados desse diretor da CNF em: br.linkedin.com.↩︎
Dados extraídos do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED)/2019.↩︎
Em dissertação concluída em dezembro de 2021, Nayara L. S. da Silva (2021) analisou as demandas históricas e conjunturais e o discurso de legitimação empregado pelos representantes dos grandes bancos comerciais no Brasil na conjuntura de 2016 a 2020. Neste trabalho, as reivindicações da CNF foram examinadas juntamente com as apresentadas por outras representações dos banqueiros, tais como: a Febraban e os principais bancos privados em exercício no país (Bradesco, Itaú Unibanco e Santander).↩︎
De acordo com Aguiar Jr. (2015), quando questionada sobre a mudança da nomenclatura da Agenda, a assessoria da CNF afirmou que ela teve o objetivo de demonstrar que os temas que constam na agenda não são restritos à área legislativa, mas expressam uma série de reivindicações do setor financeiro a serem apresentadas para diferentes ramos do Estado, como: o Legislativo, o Judiciário e o Executivo.↩︎
As áreas de interesse apontadas sofrem alteração quando comparamos os dados de 2012 e 2013-2014, pois a própria CNF passou a adotar uma nova nomenclatura a partir de 2013, e isso impactou a distribuição do número de temas monitorados.↩︎
Participaram desta audiência as seguintes representações de entidades patronais: Damião Cordeiro (CNF/FEBRABAN), Danielle Bernardes (CNT), Alexandre Venzon Zanetti (Confederação Nacional da Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços — CNS), Ivo Dall’Acqua Júnior (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviço e Turismo — CNC), Cristiano Zaranza (CNA) e Alexandre Furlan (CNI).↩︎
Cinco representantes da CNF participaram dessa Conferência: José Ricardo da Costa Aguiar Alves (Presidente Executivo), Roberta Jacarandá Moreira Azevedo (Relações Institucionais), Guilherme de França Teixeira (Relações Institucionais), Renan Brambila Bressan (Advogado) e Sara Maciel Bezerra Diniz (Relações Institucionais) (OIT, 2019).↩︎
CNA, CNC, CNI, CNT, CNSaúde, CNSeg e CONSIF. A Confederação Nacional do Sistema Financeiro (CONSIF) é a representação sindical máxima das entidades financeiras.↩︎
Resumo:
O objetivo deste artigo é examinar a
posição do capital financeiro diante da questão trabalhista e da questão
sindical na conjuntura brasileira de 2011 a 2021. Para tanto, analisamos
o conteúdo a “Agenda do Setor Financeiro” produzida pela Confederação
Nacional das Instituições Financeiras (CNF), órgão máximo de
representação das instituições financeiras no país. Ao longo do referido
período, a CNF tratou os direitos trabalhistas como inibidores do
crescimento econômico, causadores do desemprego e obstáculos para a
competitividade das empresas. Tal posicionamento conservador desempenhou
papel relevante no debate e na elaboração de medidas que promoveram a
redução de direitos trabalhistas e impuseram limites à ação
reivindicatória dos trabalhadores, por meio do primado do negociado
sobre o legislado, nas relações de trabalho.
Palavras-chave:
Capital financeiro; direitos
trabalhistas; negociação coletiva; Confederação Nacional das
Instituições Financeiras (CNF); contrarreformas sociais.
Abstract:
The purpose of this article is to
examine the position of finance capital in relation to labor and union
issues in the Brazilian context from 2011 to 2021. To do so, we analyze
the content of the “Financial Sector Agenda” produced by the National
Confederation of Financial Institutions (CNF), the highest
representation office of the Brazilian financial institutions.
Throughout this period, the CNF treated labor rights as inhibitors of
economic growth, causes of unemployment and obstacles to the
competitiveness of companies. This conservative position played a
relevant role in the debate and in the elaboration of measures that
promoted the reduction of labor rights and imposed limits to the
workers’ claiming action through the primacy of the negotiated over the
legislated in labor relations.
Keywords:
Financial capital; labor rights;
collective bargaining; National Confederation of Financial Institutions
(CNF); social counter-reforms.
Recebido para publicação em 17/09/2021
Aceito em 01/02/2022