Revista de Ciências Sociais — Fortaleza, v. 53, n. 2, jul./out., 2022
DOI: 10.36517/rcs.2022.2.a04
ISSN: 2318-4620
Agenda neoconservadora no governo Bolsonaro e a
redução da maioridade penal
Theófilo Machado
Rodrigues
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
theofilomachadorodrigues@gmail.com
Camila Carolina Hildebrand
Galetti
Universidade de Brasília, Brasil
cchgaletti@gmail.com
A eleição de Jair Bolsonaro como presidente da República, em 2018, marcou o avanço do neoconservadorismo no Brasil. Não que essa agenda não tivesse seu espaço no país já há algum tempo. Mas aquela eleição foi a primeira, na Nova República, em que um ator político da extrema-direita do espectro ideológico foi eleito presidente do país. Com Bolsonaro, temas como o Estatuto do Nascituro, que proíbe as atuais hipóteses previstas de aborto legal, o Estatuto da Família, que exclui casais homoafetivos, a proposta do fim do Estatuto do Desarmamento para garantir a liberação das armas de fogo, a escola sem partido e a redução da maioridade penal ganharam protagonismo legislativo e um aliado de peso no Poder Executivo, ainda que não tenham se concretizado até o momento.
O presente artigo analisa essa agenda neoconservadora do governo Bolsonaro a partir da proposta de redução da maioridade penal. Essa polêmica iniciativa que esteve em debate no parlamento ao longo dos anos 1990 e 2000, pela primeira vez na história da Constituição de 1988 passou a ter um presidente da República como defensor. Note-se que até mesmo outros presidentes que a literatura especializada (SANTOS; TANSCHEIT, 2019) categoriza à direita do espectro político, como Fernando Collor de Mello e Michel Temer sempre se posicionaram contrários à medida, o que revela o perfil radical do presidente eleito. Tendo a redução da maioridade penal como objeto de investigação, o artigo analisa o lócus privilegiado de formulação e agitação da proposta no governo federal, qual seja, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e as secretarias especiais que fazem parte de seu organograma. O objetivo é compreender como a agenda se conecta como política pública no governo, ou, dito com outras palavras, como a ideia encontra atores políticos que buscam materializá-la. Para realizar essa tarefa, reunimos discursos de atores do governo federal na imprensa e resoluções, notas técnicas e portarias da administração pública e do Congresso Nacional. Sempre que possível, cotejamos os materiais da imprensa com os discursos, pronunciamentos e notas oficiais disponíveis no site da presidência da República. Em situações de discrepância, foram adotados os conteúdos oficiais.
O artigo está estruturado em quatro seções. A primeira discute o avanço do neoconservadorismo no Brasil, que tem como ápice a eleição de Jair Bolsonaro em 2018. A segunda seção aborda a redução da maioridade penal como um importante elemento dessa agenda neoconservadora no país. A terceira avalia como o governo Bolsonaro lidou com a redução da maioridade penal como política pública. Por fim, a quarta seção observa o lugar do neoconservadorismo no governo Bolsonaro a partir do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandado pela ministra Damares Alves. Conclui-se que um dos principais centros das formulações conservadoras no governo Bolsonaro é o Ministério de Damares Alves, em geral, e suas secretarias especiais, em particular.
A ascensão de governos de extrema-direita pelo mundo é uma realidade vivenciada nos últimos anos e que se revelou principalmente a partir das eleições norte-americanas, com o ex-presidente Donald Trump em 2016, e também, no Brasil com a eleição de Jair Bolsonaro em 2018. Países da Europa não ficaram imunes a tal ascensão, como revela o giro à direita bastante intenso nas eleições de 2017 ocorridas em países importantes como a França, a Alemanha e a Holanda. Nesses três países, os partidos de extrema-direita foram derrotados, porém, tiveram nítido crescimento em relação aos anos anteriores no que tange à mobilização e aderência dos indivíduos pelos seus discursos. Tais avanços deram-se principalmente a partir de intensas investidas em pautas que abordam a moralidade e o conservadorismo (MOUNK, 2019).
Cabe aqui uma distinção entre centro-direita e extrema-direita. Na clássica definição de Bobbio (2001), a centro-direita é caracterizada por movimentos e doutrinas simultaneamente libertários e inigualitários, ao passo que a extrema-direita é marcada por doutrinas e movimentos antiliberais e anti-igualitários. O conceito de extrema-direita apresenta ainda os seguintes traços: irracionalismo, nacionalismo, defesa de valores e instituições tradicionais, intolerância à diversidade — cultural, étnica, sexual — anticomunismo, machismo, violência em nome da defesa de uma comunidade/raça considerada superior. Esse ideário político vincula-se aos interesses de dominação, opressão e apropriação privada da riqueza social, e distancia-se da centro-direita pela intolerância e pela violência de suas ações (SILVA et al., 2014, p. 409).
Nesse contexto, é nítido como a reorganização da extrema-direita, ainda que sem uma organicidade aparente, evidencia-se juntamente com a dobra do neoconservadorismo. Uma leitura corrente do neoconservadorismo, como a de Irving Kristol, é a de que ele “implica na promoção de valores tradicionais nas famílias, escolas e espaços cívicos, na corroboração de uma influência religiosa na vida política e no cultivo do patriotismo” (BROWN, 2019, p. 111). Esse neoconservadorismo deriva ainda em posturas autoritárias e antidemocráticas, amparadas principalmente ao ataque às agendas atreladas aos movimentos sociais, direitos humanos e minorias políticas (SOLANO, 2018).
Um exemplo recorrente é o ataque constante aos movimentos feministas por atores políticos neoconservadores, que fizeram do combate ao “assassinato de bebês” um dos temas centrais de seus discursos (MIGUEL; BIROLI; MARIANI, 2017). Operam, assim, a partir de um viés normativo e disciplinador interiorizado pelos sujeitos contemporâneos e que consolida um modelo de governança e cidadania (BIROLI et al., 2020). Esse modelo se apresenta em diversas narrativas dos atores da extrema-direita, como na figura da ministra Damares Alves, que em reunião ministerial em 2020 afirmou para o ex-ministro da Saúde, Nelson Teich, que o seu ministério estaria lotado de feministas que possuem uma pauta única: aborto (RIBEIRO, 2020). Esse contexto não se restringe apenas aos atores, agendas e linguagens de caráter religioso, porém, como menciona Brown, a influência do âmbito privado na moralidade pública, onde todas as saídas e justificativas estão atreladas à moral cristã, geram uma espécie de teocracia sem de fato sê-lo. Suas práticas, baseadas na religião, organizam legitimamente a vida comercial, pública e social (BROWN, 2019, p. 154). O que resulta na investida de tornar o Estado uma continuidade da família, mas num modelo único de família: cristã, heterossexual e conservadora.
Cabe destacar que a direita nunca esteve fora da política internacional ou nacional, porém, nos últimos anos, ela reemergiu com discursos de um neoconservadorismo radical, como contrarresposta a governos de esquerda ou progressistas. Segundo Fraser e Jaeggi (2020), dentre os diversos motivos que proporcionaram a ascensão de governos de extrema-direita, encontra-se a sua disposição em lutar por qualquer causa que negue tanto a redistribuição de renda, quanto o reconhecimento de certas identidades de minorias — negros, mulheres, homossexuais. Tal postura fragiliza prontamente os espaços de igualdade e do cuidado cívico com o bem comum que a democracia exige (BROWN, 2019, p. 224).
Nesse cenário, a agenda neoconservadora instaurou-se como suposta resposta a todas as políticas de esquerda representadas pelo governo PT e pela esquerda de forma geral nos últimos anos, como a ampliação dos direitos humanos. Em seu escopo de pautas que se sobressaem, destacamos a proibição do aborto, a ‘ideologia de gênero’ e a redução da maioridade penal. Tais pautas podem ser consideradas como dispositivos estratégicos para promover racionalidade política neoconservadora, consolidando assim um modelo de governança e cidadania neoconservador.
Nessa cartografia que se forma a partir de ataques constantes aos direitos humanos e aos movimentos feministas, é nítido que os discursos dos atores de direita, convergem em uma narrativa da crise que tem como lócus a família. A família deve ser resguardada de qualquer ataque que venha fragilizá-la ou acabar com ela. A existência de articulação política das pautas morais e de atores liderando essas no campo político não é uma novidade. No entanto, a sofisticação e expansão do neoconservadorismo abriram e acirraram os espaços de disputa, ao mostrar a capacidade de se proliferar e colocar em dúvida não apenas a estabilidade das conquistas alcançadas nos últimos anos pelos movimentos sociais, mas também a própria democracia (BIROLI et al., 2020, p. 26).
No que se refere ao avanço da agenda neoconservadora no Brasil, é necessário destacar o papel das igrejas evangélicas neopentecostais. Amparados no discurso “cristão vota em cristão”, diversos pastores atuam como cabos eleitorais de candidatos exprimindo pautas conservadoras. Como a literatura tem percebido, esse eleitorado evangélico mostrou a sua força nas eleições de 2018 (NICOLAU, 2020; GRACINO JUNIOR; GOULART; FRIAS, 2021). A ampliação do número de evangélicos, segundo alguns cientistas sociais, pode estar alinhado à fatores como o trabalho de tais igrejas nas periferias, no aumento da precarização, nas desigualdades econômicas, na falta do acesso a serviços essenciais, tendo em vista que no plano demográfico brasileiro o universo evangélico se encontra em sua maioria entre os pobres, classe média baixa, não-branco, universo feminino e menos escolarizados (ALMEIDA, 2019). Nesse contexto, as igrejas neopentecostais, principalmente a partir da década de 1990, têm crescido nas periferias do Brasil. Segundo Machado e Fernandes (1997), essa pode ser considerada como uma “empresa” sintomática do processo de integração do neopentecostalismo à lógica do mercado vigente no Brasil neoliberal, ao incorporar o conjunto de estratégias mercadológicas, aparentemente de modo intencional pela administração da Igreja, para conquistar sua “clientela”. Vale destacar que entre as eleições de 2014 e 2018, a bancada da bíblia aumentou de 75 para 85 parlamentares. Ela está atrelada à bancada BBB — “boi, bala e Bíblia”, coalizão de representantes do agronegócio, da linha dura na segurança pública e de organizações religiosas, em geral cristãs.
O papel das igrejas evangélicas na eleição de Bolsonaro em 2018 não foi trivial. Uma pesquisa realizada pelo Estudo Eleitoral Brasileiro, o ESEB, indica que cerca de 70% dos evangélicos declararam ter votado em Bolsonaro no segundo turno da eleição presidencial de 2018. Entre os católicos e espíritas essa participação no apoio à candidatura de Bolsonaro foi menor: 55% e 52% respectivamente (GRACINO JUNIOR; GOULART; FRIAS, 2021). Por que isso ocorreu? Nicolau (2020) sugere que a explicação está na “hipótese da afinidade conservadora”. Como os evangélicos, em sua maioria, têm posições conservadoras no campo comportamental, e como Bolsonaro se tornou um dos principais defensores da agenda conservadora no debate público, numa eleição em que o outro concorrente era um candidato progressista, os evangélicos não tiveram dúvida em quem apoiar — esse raciocínio também vale para os católicos conservadores. Soma-se a isso o fato de Bolsonaro ter recebido o apoio dos principais líderes evangélicos do país. Tudo isso fez com que a mobilização dos evangélicos tenha sido um dos fatores determinantes — mas não o único — para a vitória de Bolsonaro em 2018 (NICOLAU, 2020).
No que tange à segurança pública, percebemos a forte atuação da bancada BBB na defesa do armamento a partir do decreto do governo Bolsonaro que oportuniza a aquisição e o porte de armas — Bolsonaro já editou mais de vinte atos facilitando a compra de armas (LUPION, 2020). O apelo ao discurso armamentista se dá por diversos motivos, como o direito à autodefesa de cada indivíduo, a justificativa do alto índice de violência no Brasil e a pouca eficácia do Estado em amparar os indivíduos. Com isso, soma-se também o interesse econômico da indústria armamentista, tendo como horizonte a ampliação de seus lucros. Em decorrência dessa pauta, o governo federal zerou os impostos de importação de revólver e pistola, medida que entrou em vigor no Brasil no dia 01 de janeiro de 2021.
Vale salientar o quanto a discussão da defesa do armamento se entrelaça com a agenda da redução da maioridade penal no Brasil. Ambas buscam evidenciar a fragilidade da segurança pública no país, para tanto, incita a resolução de tais problemas com uma suposta segurança individual no caso da aquisição de armas e, também, no que diz respeito a menores que cometem crimes.
É de suma importância ressaltar a clivagem de raça e classe na discussão da agenda conservadora que pauta a redução da maioridade penal. De acordo com dados levantados pelo Sistema Integrado de Informações Penitenciárias do Departamento Penitenciário Nacional, 64% da população carcerária é ocupada por negros e 55% por jovens entre 18 e 29 anos. Com isso, a redução interfere na vida do jovem negro e periférico (VERDÉLIO, 2017).
Fomentar o encarceramento de menores significa potencializar a criminalização da juventude negra, além de não resolver o problema da criminalidade brasileira, mas sim, reafirmando o quanto o racismo estrutural1 pavimenta a sociedade brasileira, ou seja, de que ele é um elemento que integra a organização econômica e política da sociedade (ALMEIDA, 2019).
Nesse sentido, a agenda da redução da maioridade penal torna-se um dos fios condutores do neoconservadorismo, pois é um aliado ao reforçar hierarquias de raça e classe. A redução atua como lógica normativa e disciplinadora, que visa consolidar modelos de governança e cidadania pavimentados no medo, na criminalização. Para além disso, como afirma Lazzarato (2019, p. 46), o racismo contemporâneo que está em consonância com a agenda conservadora é, ao mesmo tempo, mutação do racismo colonial e da guerra contra as pessoas colonizadas.
Essa agenda neoconservadora em ascensão no Brasil tem como uma de suas principais bandeiras a redução da maioridade penal. A ideia geral por trás da proposta é a de que a redução da maioridade de 18 para 16 anos — alguns defendem, inclusive, a redução para 14 anos — contribuiria para melhores resultados na segurança pública. Note-se, há aqui um claro embate entre ciência e opinião pública. Apesar da literatura especializada demonstrar justamente o contrário (OLIVEIRA, 2018; LINS; FIGUEIREDO FILHO; SILVA, 2016; CAVALCANTI; OLIVEIRA, 2015; RIZZINI; VALE, 2014), isto é, que não há correlação direta entre redução da maioridade e segurança pública, essa narrativa ainda permeia grande parte do senso comum. Para termos uma ideia, pesquisa do instituto DataFolha divulgada em 2018 apontava que 84% dos entrevistados se diziam favoráveis à redução para 16 anos (CERIONI, 2019). Trata-se, portanto, não de uma questão pontual, mas de uma verdadeira agenda que tem ganhado cada vez mais espaço no país desde a Constituição de 1988. Basta dizer que, só no período do governo de Fernando Henrique Cardoso, foram apresentadas 16 PECs com esse objetivo na Câmara dos Deputados, 13 PECs no governo Lula e 8 PECs no governo de Dilma Rousseff (BRASIL, 2015a). Já no Senado, pelo menos 17 PECs foram apresentadas entre 1988 e 2015 (KWEN, 2016). Mas até 2018 essas iniciativas isoladas de deputados e senadores nunca encontraram apoio do governo federal e jamais foram aprovadas. Importante ressaltar que muitas vezes essa agenda ganha força na opinião pública e no parlamento após ser acionada pelos próprios meios de comunicação de massa. A literatura especializada já demonstrou, por exemplo, que matérias sobre crimes violentos divulgadas em grandes veículos da imprensa geram impacto na apresentação de propostas favoráveis à redução da maioridade penal (CAMPOS, 2009).
O ano de 2015 foi certamente um marco para esse debate no país. É bom lembrar que, logo no início daquele ano, a Câmara dos Deputados elegeu como seu presidente o deputado federal Eduardo Cunha, do PMDB. Ali estava o início do grande conflito político entre a Câmara dos Deputados e o governo de Dilma Rousseff, que culminaria com a abertura do impeachment da presidente no fim do ano. Em seu curto mandato de menos de um ano, abreviado por sua prisão e cassação, Cunha trouxe para a votação em plenário diversas propostas que não interessavam ao governo federal. Entre elas, a redução da maioridade penal. Foi assim que, após anos paralisada, a Proposta de Emenda Constitucional 171/93 voltou a tramitar na Câmara. A PEC tinha por objetivo reduzir a maioridade penal de 18 para 16 anos em alguns casos específicos como os de crimes hediondos — estupro e latrocínio —, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte.
Esse processo teve início em 31 de março de 2015, quando a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, CCJC, da Câmara aprovou o relatório do deputado Marcos Rogério, do PDT, favorável à admissibilidade da PEC 171/93. O que a CCJC fez foi admitir a constitucionalidade da PEC sem discutir exatamente o seu conteúdo. Após a aprovação na CCJC, Cunha criou uma Comissão Especial destinada a debater o conteúdo da proposta. Assim, em 17 de junho de 2015, a Comissão Especial aprovou o parecer do relator, deputado Laerte Bessa, do PR, pela aprovação da PEC.
Na sociedade política, a primeira grande crítica da redução da maioridade partiu da própria Dilma Rousseff. Enquanto os debates ocorriam na Comissão Especial da Câmara, a presidente da República aproveitou solenidades como a do 3º Encontro da Juventude Rural, em 29 de abril de 2015, para defender sua opinião. “Não se pode acreditar que a questão da violência que atinge o jovem decorre da questão da maioridade ou da redução dessa maioridade […]. Defendemos que a pena seja agravada para o adulto que utilizar o jovem como escudo dentro de uma organização criminosa”, enfatizou a presidente (BRASIL, 2015b). Algumas semanas antes, em 08 de abril, gestores de políticas públicas de juventude presentes no III Encontro Nacional dos Municípios com o Desenvolvimento Sustentável já haviam entregado ao ministro da Secretaria Geral, Miguel Rossetto, um manifesto contra a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos. “Estamos aqui contra o retrocesso constitucional, porque a juventude não aceita a cadeia para a sua vida”, explicou o Secretário Nacional da Juventude, Gabriel Medina (BRASIL, 2015c). E em 22 de abril, a Secretaria Nacional de Juventude, SNJ, publicou Nota Técnica em que concluía que a PEC “não está em consonância com os princípios constitucionais da proteção integral e prioridade absoluta nas políticas para infância, adolescência e juventude” (BRASIL, 2015d).
Sob a orientação de Rousseff, ministros e outros atores do governo federal também passaram a criticar a possibilidade de aprovação da PEC. Em reunião interministerial realizada em 15 de maio de 2015, com a participação dos ministros José Eduardo Cardozo da Justiça, Pepe Vargas dos Direitos Humanos, Nilma Gomes da Igualdade Racial, Edinho Silva da Comunicação Social, além do chefe de gabinete da Secretaria Geral da presidência, Robinson Almeida, e de representantes da Secretaria Nacional de Juventude o governo se posicionou de forma consensual contra a redução. “A redução da maioridade não é a melhor forma de reduzir a violência. Temos é que aprimorar as medidas socioeducativas, garantindo o direito à ressocialização”, afirmou a ministra Nilma Gomes (BRASIL, 2015e). Um exemplo dessa advocacy praticada pelo governo foi a audiência pública na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados realizada em junho de 2015. Ali, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, apresentou-se como porta-voz do governo e argumentou que a redução seria inconstitucional na medida em que a regra que estabelece a maioridade é uma cláusula pétrea (BRASIL, 2015f).2 O mesmo ministério da Justiça divulgou em 30 de junho a Nota Técnica 01/2015. Essa nota, assinada pelo próprio ministro Cardozo, entre outros agentes do ministério, sustenta que a PEC apresenta vício de inconstitucionalidade formal por desconformidade com o que prescreve o art. 60, §4°, inciso IV, da Constituição Federal, ou seja, por tentar abolir os direitos e garantias individuais (BRASIL, 2015a). Também no dia 30 de junho, o Conselho Nacional de Segurança Pública, CONASP, abordou o tema. Mas a crítica do CONASP não foi baseada na inconstitucionalidade da proposta, mas sim no impacto na Política Nacional de Segurança Pública. De acordo com o Conselho, “o ingresso de adolescentes no sistema penitenciário possibilitará uma maior influência do crime organizado sobre a vida deste adolescente e toda sua família, podendo aumentar os números da violência externa e interna” (BRASIL, 2015g). O mesmo expediente da Nota Técnica foi adotado pela Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, SEPPIR, em 29 de junho. Mas a SEPPIR deu maior ênfase à questão racial: “A redução da idade penal [...] terá como efeito o aumento do encarceramento no país e da criminalização da juventude negra e, desta forma, se sofisticará este que é mais um dos vários mecanismos de execução do racismo, o sistema penal brasileiro”, dizia o documento (BRASIL, 2015h).
A sociedade civil também se tornou uma importante agente nesse processo. Em Brasília, uma marcha realizada em 27 de maio na Esplanada dos Ministérios marcou o Dia Nacional de Luta Contra a Redução da Maioridade Penal. Contudo, o ato mais simbólico foi certamente aquele realizado no Rio de Janeiro em 14 de junho. Um movimento de jovens intitulado Amanhecer da Juventude organizou um verdadeiro festival de cultura no centro da cidade com a participação de artistas contrários à redução e um público de milhares de pessoas.
Mas toda essa pressão do governo federal e da sociedade civil não foi suficiente para impedir que a Câmara dos Deputados aprovasse aquela legislação. Com efeito, o processo foi conturbado e comprovou o interesse direto de Eduardo Cunha na matéria. Cunha abriu a votação do primeiro turno do texto formulado pela Comissão Especial na madrugada do dia 01 de julho de 2015. Mas, para a surpresa de muitos, o texto foi derrotado no Plenário. Foram 303 votos a favor, 184 votos contra e 3 abstenções. No entanto, o mínimo necessário para a aprovação de uma PEC são 308 votos. Ou seja, faltaram apenas 5 votos para a aprovação. De forma polêmica, Cunha manobrou o regimento da Câmara e colocou a matéria para ser votada novamente no dia seguinte. Assim, em 2 de julho, a proposta foi aprovada em 1º turno com 323 votos favoráveis e 155 contrários. Naquele mesmo dia, Secretários estaduais de Justiça, Cidadania, Direitos Humanos e Administração Penitenciária divulgaram um manifesto contra a aprovação em primeiro turno na Câmara. O documento seguiu a linha do CONASP e argumentou que “o impacto da mudança legislativa seria a inclusão anual no sistema prisional de dezenas de milhares de adolescentes, agravando o quadro atual de superlotação e implicando um custo elevado para a construção e custeio de novas unidades prisionais” (BRASIL, 2015i). Mas não surtiu efeito algum. Em 19 de agosto de 2015, a Câmara aprovou, em segundo turno, a PEC 171/93, com 320 votos a favor e 152 contra. Assim, a proposta passou ao Senado como PEC 115/2015.
No Senado, no entanto, a PEC não encontrou a mesma celeridade. Ao contrário de Eduardo Cunha, o presidente do Senado, Renan Calheiros, do PMDB, manifestou-se diversas vezes contrário à redução da maioridade penal.3 E a resistência não partia apenas de Calheiros. Um levantamento feito pelo site G1, do Grupo Globo, mostrou que, em agosto de 2015, apenas 27 senadores se manifestaram a favor da PEC (ALEGRETTI, 2015). Dos 81 senadores, 45 seriam contrários e 9 não quiseram se posicionar. Esse número era insuficiente já que para que uma PEC ser aprovada são necessários os votos favoráveis de pelo menos 49 dos 81 senadores. Além de não ter maioria favorável de senadores e nem contar com a simpatia do presidente da casa, a proposta encontrou um outro obstáculo: a abertura do processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff que praticamente paralisou a tramitação de projetos no Congresso Nacional até o segundo semestre de 2016. Em meio a essa confusão, a PEC 115/2015 não encontrou no Senado a mesma facilidade que teve na Câmara e acabou engavetada.
Com a eleição presidencial do conservador Jair Bolsonaro, em outubro de 2018, os defensores da redução da maioridade penal encontraram uma janela de oportunidade política para a volta daquela agenda (TARROW, 2009). Já em seu programa de governo registrado no TSE, a candidatura de Bolsonaro apontava que a redução da maioridade penal para 16 anos seria uma prioridade (BRASIL, 2018). Ou seja, diferente do que houve em 2015, agora a PEC 115/2015 contaria efetivamente com o apoio do governo federal para ser aprovada. Em tese, essa janela de oportunidade foi ainda mais alargada com a derrota de Renan Calheiros na disputa pela presidência do Senado no início de 2019. Em seu lugar, assumiu o senador Davi Alcolumbre, do DEM, um defensor da redução da maioridade. Um comentário de Bolsonaro ao lado de seu ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, em 08 de agosto de 2019, exemplifica essa percepção:
Eu vou pedir para o Davi Alcolumbre, que é o presidente do Senado Federal, que lá tem uma Proposta de Emenda Constitucional que passou na Câmara para reduzir a maioridade penal para alguns tipos de crime. Não era o que eu gostaria. Eu gostaria que passasse simplesmente pra 16 anos, a maioridade plena a partir dessa idade. Mas a Câmara botou ali, para ter 1 acordo com alguns partidos, que só por exemplo: tráfico de drogas, lesão corporal seguida de morte, sequestro […] (FREIRE, 2019).
Não obstante a declaração do próprio presidente da República e o fato da PEC 115/2015 já ter passado pela Câmara e só faltar a tramitação no Senado, o governo Bolsonaro fez um giro e passou a dar suporte para uma nova proposta ainda mais radical, a PEC 32/2019. Apresentada em 26 de março de 2019, no início do governo de Jair Bolsonaro, a PEC 32 altera a redação do artigo 228 da Constituição e estabelece a responsabilidade penal aos maiores de 16 anos de idade na hipótese de cometimento de crimes previstos na legislação e aos maiores de 14 anos de idade quando da ocasião de crimes definidos como hediondos, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo, organização criminosa e associação criminosa. Apesar de ser conhecida como a “PEC do Flávio Bolsonaro”, senador que é filho do presidente da República, a autoria da proposta foi coletiva com a assinatura de 33 senadores. Esse número de assinaturas é relativamente alto se considerarmos que essa casa legislativa é composta por 81 senadores, mas ainda não foi o suficiente: para que uma PEC seja aprovada são necessários 49 votos, ou seja, faltariam 16 senadores para o seu sucesso. Entre os autores estavam 7 senadores do PSD, 6 do PODEMOS, 4 do MDB, 4 do PSL, 3 do PP, 3 do DEM, 2 do PSDB, 1 do PR, 1 do PRB, 1 do PPS e 1 do PSB. Como era de se esperar, a maior parte desses partidos estão à direita do espectro político. Essa listagem corrobora a pesquisa feita por Kwen (2016) sobre os partidos que apresentaram PECs na Câmara e no Senado entre 1988 e 2015. A autora já havia percebido que os partidos de esquerda como PT, PCdoB e PSOL nunca apresentaram matérias nessa direção.
O debate no Legislativo avançou e, em 25 de junho de 2019, foi lançada, em Brasília, a Frente Parlamentar Mista da Redução da Maioridade Penal. A iniciativa foi do deputado federal Carlos Jordy, do PSL, e contou com assinaturas de 194 deputados, nove senadores e 17 partidos políticos. Nenhum parlamentar de partidos de esquerda como PT, PCdoB e PSOL constou como signatário da Frente. Mas não se pode dizer que essa posição tenha sido uma unanimidade na esquerda. Cinco deputados do PDT e quatro do PSB estiveram entre os apoiadores da Frente.
Apesar do já mencionado apelo de Bolsonaro, o presidente do Senado, Alcolumbre, preferiu priorizar a agenda econômica em 2019. E em 2020, com o início da pandemia do Coronavírus, o clima para esse tipo de proposta no Congresso esfriou.
Ao mesmo tempo em que a PEC começou a tramitar no Legislativo, diversos atores do governo de Jair Bolsonaro passaram a defender a agenda da redução da maioridade penal. Essas opiniões não foram difusas, mas sim organizadas politicamente, e os próprios ministérios foram instados a emitir pareceres sobre a proposta (SAKAMOTO, 2020a). Diga-se de passagem, essa foi a primeira vez em que um governo federal se posicionou desse modo. O “Fórum Nacional sobre Letalidade Infanto Juvenil”, organizado em setembro de 2020 pela Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos foi um desses espaços em que o debate esteve presente. Em sua intervenção na abertura do Fórum, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, fez uma forte defesa da redução. “Creio que a sociedade, em geral, está cansada de ver menores praticando crimes. Hoje, um menino de 16 anos pode portar uma arma, matar um pai de família e a sociedade o acolherá como vítima da própria sociedade. É quase um direito para tirar a vida de qualquer pessoa”, defendeu Ribeiro (BRASIL, 2020).
Em dezembro de 2020, foi a vez da polêmica girar em outro espaço interno do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos: a Secretaria Nacional de Juventude, SNJ. Para defender a redução, a Nota Técnica 132/2020, assinada pela Secretária Nacional de Juventude, por Emilly Rayanne Coelho Silva, e por sua chefe de gabinete, Mayara Lopes Gonçalves, sustenta que uma “punição mais rigorosa pode auxiliar as pessoas a se comportarem de acordo com as leis” (SAKAMOTO, 2020b).4 A resposta da sociedade civil contra o parecer da Secretaria Nacional de Juventude foi imediata. Com um discurso semelhante ao do governo Dilma Rousseff, a Pastoral do Menor, organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil — CNBB, manifestou seu repúdio por meio de uma nota pública. Segundo a Pastoral, a PEC é inconstitucional na medida em que altera uma cláusula pétrea da Constituição. Ou seja, a redução da maioridade só poderia ser feita mediante nova Assembleia Constituinte (CNBB, 2020). Também investiram contra a nota técnica da SNJ os próprios ex-Secretários Nacionais de Juventude e ex-Presidentes do Conselho Nacional de Juventude, CONJUVE, além de diversas outras organizações.
Como vimos na seção anterior, a SNJ já havia publicado uma Nota Técnica em 2015 na qual apresentava argumentos sólidos contra a redução da maioridade penal. Agora, em 2020, sob outro governo, com outra matriz ideológica, a SNJ emitiu nova Nota Técnica em que deu parecer favorável à redução. Essa mudança radical da SNJ em apenas cinco anos comprova que a Nota Técnica é, em verdade, um documento político, em que argumentos são manobrados ou selecionados conforme o interesse programático do governo em questão.5 A próxima seção aborda o lugar do conservadorismo no governo Bolsonaro a partir da instância em que a SNJ está instalada, qual seja, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos sob o comando da ministra Damares Alves.
O Estado é laico, mas esta ministra é terrivelmente cristã.6
Não há muitas dúvidas de que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos seja uma das principais fontes da produção do discurso neoconservador no governo Bolsonaro. Para entendermos melhor esse lugar da gestão pública, vale a pena recuperarmos sua trajetória organizativa. Originalmente, o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos foi criado pela ex-presidenta Dilma Rousseff (PT) na reforma administrativa realizada em outubro de 2015. Esse tinha como objetivo fortalecer e aprimorar as políticas de gênero, de combate ao racismo e a proteção dos direitos humanos no país. Até aquele momento, havia na estrutura ministerial secretarias especiais separadas como a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, a Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres e a Secretaria de Direitos Humanos. Rousseff as uniu em um único ministério. Mas o impeachment da presidenta mudou esse cenário. Em maio de 2016, Michel Temer extinguiu aquele órgão e repassou suas funções para o Ministério da Justiça e Cidadania. Sobre esse aspecto, Rangel e Dultra (2019), ao analisarem as medidas adotadas pelo governo que assumiu a Presidência da República após a destituição de Rousseff, em 2016, afirmam que o governo Temer inferiorizou a defesa dos direitos humanos, das mulheres e da igualdade racial, cuja evolução, tanto política quanto social, diz respeito a uma conquista da sociedade brasileira. E, diante da depreciação de políticas públicas de caráter social, se caracteriza a investida de enfraquecer movimentos sociais. Ademais, a medida fazia parte de sua agenda neoliberal de redução do Estado e, consequentemente, de redução das pastas ministeriais. Mas a forte crítica da sociedade civil, associada à uma necessária acomodação administrativa de aliados no governo, o fez voltar atrás e recriar, em fevereiro de 2017, o Ministério dos Direitos Humanos. Finalmente, em janeiro de 2019, o presidente Bolsonaro criou o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, MMFDH.
A titular do ministério é a pedagoga, pastora evangélica e advogada Damares Alves, ministra declaradamente antifeminista, conhecida por suas falas polêmicas no que tange às discussões de gênero, mulheres e família. Esse novo MMFDH é composto por oito Secretarias Nacionais: Secretaria Nacional de Política para as Mulheres, Secretaria Nacional da Família, Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Secretaria Nacional da Juventude, Secretaria Nacional de Proteção Global, Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência e Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa.
Por meio dessas Secretarias Nacionais a agenda neoconservadora se evidencia a partir de diversas campanhas e projetos, que em sua maioria pautam questões atreladas à moralidade. Como afirma Biroli et al. (2020, p. 59), uma das facetas do neoconservadorismo é que ele opera como uma maquinaria legal, mobilizando estratégias e argumentos para a restauração moral. Um exemplo disso foi a campanha liderada pela ministra Damares Alves por meio da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente em consonância com o Ministério da Saúde, intitulada “Tudo tem seu tempo”, que visa a educar jovens sobre sexo e gravidez na adolescência. A ação tem como foco duas faixas etárias: de 15 a 19 anos e abaixo de 15 anos. Foi gasto um montante de 3,5 milhões de reais em tal campanha, que faz parte da Semana Nacional de Prevenção à Gravidez Precoce, criada pelo presidente Jair Bolsonaro em janeiro de 2019. Segundo a ministra Damares Alves, a campanha Tudo tem seu tempo, foi inspirada no movimento Eu escolhi esperar, o qual é liderado pelos pastores Nelson Junior e Angela Cristina de Vitória/ES. Tal movimento defende o sexo depois do casamento e visa a abstinência sexual dos jovens. A crítica à campanha pautada pela ministra Damares se concentra principalmente ao fato de não se propor a discutir sexo entre jovens e adolescentes, sobre métodos contraceptivos ou as problemáticas inseridas a partir de uma gravidez na adolescência. Ao contrário, a campanha foca na abstinência sexual pautando valores morais cristãos, além do fato de que pesquisas já demonstraram que “políticas de abstinência sexual não promoveram mudanças positivas na iniciação sexual e na vida sexual dos jovens, de modo que não impedem nem a gravidez na adolescência nem a propagação de infecções sexualmente transmissíveis entre os jovens” (ZYLBERKAN, 2020).
Tal exemplo revela que a nova formatação do Ministério da Mulher abarca diversas pautas que demandam políticas e estratégias totalmente distintas. Outro exemplo que sinaliza o desmantelamento das políticas públicas é como se deu o processo de enfraquecimento das agendas feministas nos últimos anos no Brasil. Em janeiro de 2018, foi anunciada a vinculação da Secretaria de Políticas para Mulheres, SPM, ao Ministério dos Direitos Humanos, que na época era comandada pelo ministro Gustavo Rocha. A mudança foi oficializada por meio de um decreto do ex-presidente Michel Temer. Com isso, a SPM perdeu autonomia em sua atuação no governo Temer, a verba destinada à Secretaria diminuiu e várias ações, projetos que estavam em vigência tiveram que ser interrompidos por falta de verbas. Além desta questão, ressaltamos que o governo Temer foi o primeiro, desde Ernesto Geisel na década de 1970, a não ter mulheres na Esplanada (AMORIM; PRAZERES; MARCHESAN, 2016). Essa desvalorização permaneceu no governo Bolsonaro que indicou apenas duas mulheres para o ministério: além de Damares, a ministra Tereza Cristina na Agricultura. Bom que se diga, a literatura especializada indica que, do governo Collor até o de Dilma, houve uma presença relativamente crescente de mulheres nos ministérios (D´ARAUJO; RIBEIRO, 2018).
Na SPM do governo Bolsonaro, a primeira responsável pela pasta foi a ex-deputada federal e frequentadora da Igreja Universal do Reino de Deus, Tia Eron, do PRB. Em maio de 2019, Tia Eron foi substituída por outra filiada do PRB, a advogada Cristiane Britto. O exemplo da SPM demonstra de certa forma uma manobra de silenciamento da agenda feminista no âmbito governamental e na ideia de que não é necessária uma secretaria exclusivamente voltada às mulheres, atrelando suas pautas as da família e dos direitos humanos como se tudo estivesse no mesmo escopo. Esse contexto evidencia na prática as estratégias conservadoras no governo Bolsonaro, e principalmente, o empenho do Ministério da Mulher em ressignificar as categorias mulher e criança, pois estas tornam-se imagens importantes para se produzir uma dimensão de direitos sob uma lente e projeto político conservador.
A Secretaria Nacional de Juventude, SNJ, também se tornou esse espaço irradiador do neoconservadorismo. Num primeiro momento, a SNJ foi ocupada pela ex-vereadora Jayana Nicaretta do PP. Nicaretta era uma das principais lideranças no ministério por trás da polêmica campanha que incentiva a abstinência sexual para a prevenção da gravidez. No entanto, Nicaretta permaneceu no cargo por menos de dois anos. Em agosto de 2020, foi demitida e em seu lugar assumiu a advogada Emilly Rayanne Coelho Silva. Emilly foi a responsável pela já mencionada Nota Técnica 132/2020 em favor da redução da maioridade penal.
Até mesmo a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que numa primeira vista poderia dar a impressão de ser insulada das disputas políticas, enfrentam graves acusações. Sua titular, a secretária Priscila Gaspar, tem sido acusada pela imprensa de promover “perseguição nas redes contra líderes surdos que pensam e se posicionam diferente dela”, além de usar “o seu cargo para constranger profissionais tradutores de Libras” (PLATINI, 2019). Segundo Platini (2019), a secretária “não tem nenhum constrangimento de usar a máquina governamental para promover perseguição a qualquer pessoa que critica qualquer postura do governo Bolsonaro”.
Já a Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial teve problemas de outra ordem. A secretária da pasta foi a jornalista indígena Sandra Terena. Todavia, uma questão pessoal culminou com a sua demissão em setembro de 2020. Seu marido, o blogueiro Oswaldo Eustáquio, foi preso pela Polícia Federal por suspeita de publicar fake news e de incentivar atos antidemocráticos contra o STF e o Congresso Nacional. Essa imagem autoritária e conservadora recaiu sobre a secretária que acabou sendo demitida. A pasta ficou sem titular por três meses até que, em janeiro de 2021, foi escolhido um ex-coronel do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal para chefiar a pasta (RODRIGUES, 2021).
Pastores evangélicos dirigem ainda outras secretarias. A Secretaria de Proteção Global teve como titular o pastor evangélico Sérgio Augusto de Queiroz. O pastor prega nas igrejas Batista Cidade Vida e Batista da Lagoinha, sendo a última frequentada pela própria Damares Alves. Já a Secretaria da Pessoa Idosa é liderada por Antônio Fernandes Toninho Costa, pastor evangélico da Primeira Igreja Batista no Guará, em Luziânia, Goiás, e filiado ao Partido Social Cristão, PSC (GRIGORI, 2019). Cabe ressaltar que a nomeação de religiosos não é uma novidade na política brasileira. A participação política dos evangélicos como um todo se potencializou durante a Assembleia Nacional Constituinte (ANC), realizada entre 1987 e 1988. A ANC contou com um grande contingente de deputadas e deputados de confissão cristã evangélica, reconhecida/os como uma “grande novidade” política, porém, esse fenômeno se potencializou com mais afinco nas eleições de 2018 com a participação massiva de evangélicos na candidatura de Bolsonaro (NICOLAU, 2020; GRACINO JUNIOR; GOULART; FRIAS, 2021).
Os pilares que sustentam as ascensões neoconservadoras encontram-se na moralidade, na antidemocracia, nos desmontes da solidariedade social e orientam-se por lógicas racistas e masculinistas. Com relação ao último aspecto, o masculinismo, é interessante salientar os caminhos que Brown nos indica sobre a temática, ao afirmar que um dos efeitos do neoliberalismo, é a insegurança crescente da masculinidade branca destronada. Essa se manifesta de diversas formas, porém remonta, principalmente, aos ataques às feministas que, segundo a cientista política, são uma forma niilista de ação (BROWN, 2019, p. 209).
A família, a mulher e as crianças são os sustentáculos para que se dissemine um modelo exclusivo de família e de cidadania esperado dos indivíduos nessa lógica. Segundo Flávia Biroli (2019), a apologia à família é um ponto de convergência entre diferentes neoconservadorismos e se conecta a duas faces do recesso democrático, a restrição da dimensão pública da política e a restrição de direitos individuais e de minorias, apoiada na noção de “maioria moral”.
De acordo com Brown (2019), a moralidade em questão aqui é ressentida, manifesta frustrações e a tentativa da retomada do que um dia esteve em vigência, e é pautada — como já foi mencionado — pela chave da religiosidade. Para ela, o ressentimento é um tipo de afeto. E os afetos estão sendo retomados para se pensar a conjuntura política e social nos últimos anos por diversos intelectuais, tais como Vladimir Safatle, Frédéric Lordon, Eva Illouz etc., principalmente a partir do ódio e do amparo/desamparo, na tentativa de compreensão da ascensão dos atores neoconservadores e dos ataques que a democracia vem sofrendo nas últimas décadas. Para Wendy Brown, a moralidade proposta e praticada por esses grupos neoconservadores, tem como finalidade instaurar uma cultura antidemocrática a fim de que desapareçam os espaços de igualdade, equidade, cuidado cívico que a democracia exige e reivindica, se distanciando assim da conceitualização de moral proposta pelos precursores do neoliberalismo — Hayek e Friedman.
Face ao exposto, percebemos que o neoconservadorismo ocupa um lugar de destaque no governo Bolsonaro, sendo ele a força motriz das estratégias, pautas e principalmente o que pavimenta a disputa pela gramática dos direitos humanos, quando transforma movimentos sociais em inimigos políticos. Um exemplo que ilustra tais tentativas de deslegitimação, é o projeto de lei 3.019/2020 do deputado federal Daniel Silveira, do PSL, com a proposição de tipificar os grupos antifascistas — “antifas” —, e demais organizações com “ideologias similares” como organizações terroristas, junto à Lei Antiterrorismo (FREY, 2020). Não se trata de uma proposta sem conexão com o governo, na medida em que o próprio Bolsonaro demonstrou concordância com o tema ao declarar para a imprensa que os movimentos “antifas” deveriam ser enquadrados como terroristas (SOARES, 2020). O resultado disso é a criminalização da luta pelos direitos humanos, a naturalização das desigualdades e a moralização das inseguranças que podem ser vislumbradas a partir da agenda da redução da maioridade penal.
No decorrer da discussão proposta, procurou-se visibilizar o quanto a agenda neoconservadora se evidencia no governo de Jair Bolsonaro, bem como, a relevância que os Ministérios e as Secretarias possuem na tentativa de pavimentar o caminho à consolidação desta agenda e destituição de pautas relacionadas aos direitos humanos e movimentos sociais. Não se descarta, à esteira das análises de Fraser (FRASER e JAEGGI, 2020), o quanto o que vivenciamos, não apenas no Brasil, mas no mundo, pode ser entendido como, entre muitos outros fatores, uma reação às conquistas de muitos movimentos como a ampliação de direitos sociais.
Procurou-se focar na discussão acerca da redução da maioridade penal, por compreendermos que essa é uma pauta de extrema importância à agenda conservadora e que, pela primeira vez, um governo brasileiro defende e se mobiliza com afinco para que seja aprovada. Nesse sentido, a defesa da agenda da redução de maioridade penal envolve uma multiplicidade de atores, ideias, interesses, instituições, demandas da sociedade civil que passam à margem de fáceis generalizações e simplificações tentadoras (CAMPOS, 2009), além de intensificar o embate entre ciência e opinião pública, essa última que mobiliza afetos, sentimentos como de segurança ou insegurança, amparo ou desamparo, e que influenciam na aderência dos indivíduos na defesa da pauta.
Em síntese, acreditamos que a presente investigação trouxe três contribuições principais ao campo. Em primeiro lugar, elementos para uma caracterização sociológica do neoconservadorismo do governo Bolsonaro em acréscimo ao que a literatura especializada já vem apontando. Em segundo lugar, um subsídio para a sociedade civil a partir da atualização do processo de debate público acerca da redução da maioridade penal no Brasil. Por fim, uma análise de governança e política pública sobre o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e suas secretarias especiais.
O artigo não buscou esgotar o assunto por entender a complexidade e a não linearidade das sociedades democráticas. Mas, buscamos apontar o quanto o governo de Bolsonaro tornou-se uma janela de oportunidade política para que a agenda da maioridade penal se fortaleça, além de promover a manutenção do ideário de que o ingresso de adolescentes no sistema penitenciário possibilitará mais segurança à sociedade.
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O conceito de racismo estrutural propõe um rompimento com as análises que restringem o racismo aos comportamentos individuais. Segundo Almeida (2019), o racismo estrutural se origina na operação de forças estabelecidas e respeitadas na sociedade e, portanto, recebe muito menos condenação pública do que o primeiro tipo, o individual.↩︎
Considera-se como cláusula pétrea o dispositivo constitucional que não pode ser alterado nem mesmo por Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Sobre a idade penal como cláusula pétrea, ver Corte Real e Conceição (2013) e Alves et al. (2009).↩︎
Apesar de pertencerem ao mesmo partido, o PMDB, as diferenças políticas entre Eduardo Cunha e Renan Calheiros eram conhecidas. As famosas gravações do ex-senador Sergio Machado no contexto do impeachment de Dilma Rousseff revelam essas diferenças políticas (FERNANDES, 2018).↩︎
Apesar de ter circulado em vários veículos da imprensa, a Nota Técnica 132/2020 não está disponível no site do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.↩︎
Não há qualquer juízo de valor nessa constatação. Entendemos que as ações governamentais são, em geral, formuladas de acordo com a agenda de interesses dos respectivos governos de plantão (DAHL, 2012).↩︎
Damares Alves em seu discurso de posse no ministério em janeiro de 2019 (VIVAS, 2019).↩︎
Resumo:
O artigo analisa a agenda neoconservadora
do governo Jair Bolsonaro a partir da proposta de redução da maioridade
penal. A primeira seção discute o avanço do neoconservadorismo no país,
que tem como ápice a eleição de Bolsonaro em 2018. A segunda seção
aborda a redução da maioridade penal como um importante elemento dessa
agenda neoconservadora. A terceira avalia como o governo Bolsonaro tem
lidado com a redução da maioridade penal. Por fim, a quarta seção
observa o lugar do neoconservadorismo no governo federal a partir do
Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandado por
Damares Alves. Conclui-se que um dos principais centros da agenda
neoconservadora no governo Bolsonaro é o Ministério da Mulher.
Palavras-chave:
Maioridade penal;
neoconservadorismo; juventude.
Abstract:
This article analyzes the
neoconservative agenda of the Jair Bolsonaro government through a
focused look at the proposal to reduce the age of criminal
responsibility. The first section discusses the advancement of
neoconservatism in the country with the apex of Bolsonaro in 2018 as its
culmination. The second section addresses the reduction of the age of
criminal responsibility as an important element of this neoconservative
agenda. The third assesses how the Bolsonaro government handled the
reduction of the age of criminal responsibility. Finally, the fourth
section looks at the place of conservatism in the federal government
from the Ministry of Women, Family and Human Rights led by conservative
Damares Alves. It is concluded that the epicenter of conservative
formulations in the Bolsonaro government is the Ministry of Damares
Alves.
Keywords:
Criminal majority; neoconservatism;
youth.
Recebido para publicação em 08/03/2021
Aceito em 20/05/2022
ACESSO ABERTO
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