Duarte; Araújo; Paula | Práticas informacionais
Inf. Pauta, Fortaleza, CE, v. 2, número especial, out. 2017
sociedade é identificada, mas também essa mesma atividade por parte do meio científico que
se julga desinteressado, neutro e acima das questões de julgamento moral.
O trabalho de Silva voltava-se, no início, apenas para o estudo da informação em
saúde, especificamente a questão da disseminação de informações sobre as doenças
sexualmente transmissíveis (DSTs), e sua importância na prática dessas profissionais. O
trabalho de campo, contudo, foi revelador em termos de subverter as expectativas iniciais da
pesquisa e da ordem de importância dos diferentes tipos de informação com as quais as
profissionais do sexo se relacionavam. Foram estabelecidos, após o trabalho de campo,
quatro eixos de análise: informação sobre questões trabalhistas, sobre legislação penal, sobre
saúde e sobre o cotidiano.
Em relação à informação sobre trabalho, percebeu-se um grande desinteresse das
profissionais entrevistadas, ou seja, não há por parte delas uma necessidade de informações
sobre esse assunto. Tal resultado contradiz tanto os discursos oficiais do poder público
quanto aquele das associações profissionais das prostitutas. No âmbito desses dois discursos,
é frequente a defesa da legalização da profissão, pois isso significaria uma série de vantagens:
possibilidade de férias, décimo-terceiro salário, fundo de garantia, previdência social. Além
disso, ajudaria a melhorar as condições em que o trabalho é exercido (higiene, espaço físico)
e, principalmente, poderia minimizar riscos frequentes como a violência física a que são
normalmente submetidas as profissionais do sexo. Olhando assim, desse modo, a questão,
pode parecer inaceitável o comportamento das prostitutas. Contudo, é preciso situar a
postura delas no quadro de sua experiência cotidiana, pois é no contexto concreto que as
ações ganham sentido. Na verdade, as profissionais do sexo têm um grande receio de serem
percebidas socialmente como tais, e de sofrerem os efeitos do estigma que cerca a profissão.
Nesse sentido, legalizar-se profissionalmente seria uma ameaça a seus projetos de vida. Além
disso, a prostituição é sempre vista como uma experiência temporária, uma atividade
transitória, o que também diminui a importância de sua legalização. Uma outra razão diz
respeito aos ganhos concretos: a avaliação comum é que se ganha mais no regime informal,
sem a necessidade de pagar impostos, do que se houvesse legalização. Assim, o que a
princípio poderia ser uma lacuna informacional (ausência de conhecimento sobre algo) e um
defeito de não identificação ou compreensão dessa lacuna é, na verdade, uma elaboração
muito singular dessas profissionais, que passa por desconstruir o discurso oficial e não
perceber as questões trabalhistas como uma lacuna. Mais importante ainda: não se trata da
repetição de um discurso produzido num outro lugar. Essa visão é construída por meio de
uma série de interações estabelecidas entre elas e outras pessoas, como advogados, clientes,